“Se examinarmos um indivíduo isolado sem o
relacionarmos com o que o rodeia, todos os seus atos nos parecem livres. Mas se
virmos a mínima relação entre esse homem e quanto o rodeia, as suas relações
com o homem que lhe fala, com o livro que lê, com o trabalho que está fazendo,
inclusivamente com o ar que respira ou com a luz que banha os objetos à sua
roda, verificamos que cada uma dessas circunstâncias exerce influência sobre
ele e guia, pelo menos, uma parte da sua atividade. E quantas mais influências
destas observamos mais diminui a ideia que fazemos da sua liberdade, aumentando
a ideia que fazemos da necessidade a que está submetido.
(...)
A gradação da liberdade e da necessidade maiores ou menores depende do lapso de
tempo maior ou menor desde a realização do ato até à apreciação desse mesmo ato.
Se examino um ato que pratiquei há um minuto em condições quase as mesmas em
que me encontro atualmente, esse ato parece-me absolutamente livre. Mas se
aprecio um ato realizado há um mês, ao encontrar-me em circunstâncias
diferentes, a meu pesar, se não tivesse realizado esse ato, não existiriam
muitas coisas inúteis, agradáveis e necessárias que derivam dele. Se me
translado com a memória a um ato mais remoto, a um ato de há dez anos ou mesmo
mais, então as suas consequências ainda se me apresentarão mais evidentes e
ser-me-á difícil representar-me seja o que for, caso aquele ato remoto nunca
tivesse existido.
Quanto mais retroceder na minha memória,
ou, o que vem a dar na mesma, quanto mais projetar no futuro o meu juízo, tanto
mais duvidosos me parecerão os meus raciocínios acerca da liberdade do ato
realizado.”
Leon
Tolstoi, in Guerra e Paz
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