Os romeiros
sobem a ladeira
cheia
de espinhos, cheia de pedras,
sobem a ladeira
que leva a Deus
e vão deixando culpas
no caminho
Os sinos tocam,
chamam os romeiros
Vinde lavar
vossos pecados
Já estamos,
puro, sino, obrigados
Mas
trazemos flores, prendas e rezas
No alto do morro
chega a procissão
Um leproso de
opa empunha o estandarte
as
coxas das romeiras brincam no vento
Os homens
cantam, cantam sem parar
Jesus no lenho
expira magoado
Faz
tanto calor, há tanto algazarra
Nos
olhos do santo há sangue que escorre
Ninguém
não percebe, o dia é de festa
No adro da
igreja há pinga, café
imagens,
fenômenos, baralhos, ciganos
e um sol imenso
que lambuza de ouro
o pó das feridas
e o pó das muletas
Meu Bom Jesus
que tudo podes,
humildemente
te peço uma graça
Sarai-me,
Senhor, e não desta lepra,
do amor que eu
tenho e que ninguém me tem
Senhor, meu amo,
dai-me dinheiro
muito dinheiro,
para eu comprar
aquilo
que é caro mas é gostoso
e que na minha
terra ninguém possui
Jesus
meu Deus pregado na Cruz,
me dá coragem
pra eu matar
um que me amola
de dia e de noite
e diz gracinhas
a minha mulher
Jesus, Jesus
piedade de mim
Ladrão eu sou
mas não sou ruim não
Por
que me perseguem não posso dizer
não quero ser
preso, Jesus ó meu santo
Os
romeiros pedem com os olhos
pedem com a
boca, pedem com as mãos
Jesus, já
cansado de tanto pedido
dorme sonhando com outra humanidade.
Carlos Drummond de Andrade
Nenhum comentário:
Postar um comentário