“A seriedade é uma doença, e o mais sério
dos animais é o burro. Ninguém lhe tira, nem com afagos nem com a chibata
aquele semblante cabido de mágoas recônditas que o ralam no seu peito. Há nele
a linha, o perfil do sábio refugado no concurso ao magistério, do candidato á
câmara baixa bigodeado pela perfídia de eleitores que, saturados de genebra e
Carta constitucional, desde a taberna até à urna, fermentaram a crisálida de
consciências novas. O burro é assim triste por fora; mas é feliz por dentro, e
riria dos seus homônimos, se pudesse igualá-los na faculdade de rir, que é
exclusiva do homem e da hiena, a qual ri com umas exultações ferozes tão
autênticas como as lágrimas insidiosas do crocodilo.”
Camilo
Castelo Branco, in Cancioneiro Alegre (1879)
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