“Não invejemos a certa espécie de gente as suas
grandes riquezas: eles as têm à custa de um ônus que não nos daria bom cômodo.
Estragaram o seu repouso, a sua saúde, a sua felicidade e a sua consciência,
para as conseguir: isso é caro demais, e não há nada a ganhar por esse preço.
Quando se é novo, muitas vezes é-se pobre: ou ainda
não se fez aquisições, ou as heranças ainda não vieram. A gente torna-se rico e
velho ao mesmo tempo; tão raro é poderem os homens reunir todas as vantagens!
E se isso acontece a alguns, não há que invejá-los:
eles têm a perder com a morte o bastante para serem lamentados. É preciso
trinta anos para pensar na fortuna; aos cinquenta está feita; constrói-se na
velhice e morre-se quando ainda se está às voltas com pintores e vidraceiros.
Qual o fruto de uma grande fortuna, se não gozar a vaidade, indústria, trabalho
e esforço dos que vieram antes de nós, e trabalharmos nós mesmos, plantando,
construindo, adquirindo, para a posteridade?
Em todas as
condições, o pobre está mais próximo do homem de bem, e o opulento não está
longe da ladroeira. A capacidade e a habilidade não levam a grandes riquezas.”
Jean de La Bruyére, in Os Caracteres
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