Sérgio
Vuskovic me conta os últimos dias de José Tohá. - Suicidou-se - disse o general
Pinochet. O governo não pode garantir a imortalidade de ninguém - escreveu um
jornalista da imprensa oficial.
-
Estava magro por causa dos nervos - declarou o general Leigh.
Os
generais chilenos odiavam-no. Tohá tinha sido ministro da Defesa no governo
Allende, e conhecia os seus segredos.
Estava
num campo de concentração, na ilha de Dawson, ao sul do sul.
Os
prisioneiros estavam condenados a trabalhos forcados. Debaixo da chuva, metidos
no barro ou na neve, os prisioneiros carregavam pedras, erguiam muros,
colocavam encanamentos, pregavam postes e estendiam cercas de arame farpado.
Toha,
que tinha um metro e noventa de altura, estava pesando cinquenta quilos. Nos
interrogatórios, desmaiava. Era interrogado sentado numa cadeira, com os olhos
vendados. Quando despertava, não tinha forcas para falar, mas sussurrava:
- Escute, oficial. Sussurrava:
-
Viva os pobres do mundo.
Estava
há algum tempo tombado na barraca, quando um dia levantou-se. Foi o ultimo dia
em que se levantou.
Fazia
muito frio, como sempre, mas havia sol. Alguém conseguiu café bem quente para
ele e o negro Jorquera assoviou para ele um tango de Gardel, um daqueles velhos
tangos dos quais ele tanto gostava.
As pernas tremiam, e a cada passo os
joelhos se dobravam, mas Tohá dançou aquele tango. Dançou-o com uma vassoura,
magra como ele, ele e a vassoura, ele encostando o cabo da vassoura em sua cara
de fidalgo cavalheiro, os olhinhos fechados, até que numa volta caiu ao chão e
já não conseguiu mais levantar. Nunca mais foi visto.
Eduardo
Galeano, in O livro dos abraços
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