A Sony Pictures está sofrendo um processo por parte
dos herdeiros de William Faulkner por causa de uma frase do autor que aparece
no filme “Meia Noite em Paris” de Woody Allen. A frase é a famosa “The past is not dead. It’s not even
past” (“O passado não morreu. Na verdade, ele nem sequer passou”.) Quando
vi essa notícia, gelei, porque eu mesmo já devo ter citado essa frase mais
vezes do que Woody Allen. Toda vez que o porteiro me entrega a correspondência,
o primeiro envelope que procuro é o da intimação judicial.
O texto enviado à Sony reclama que a produtora não
pediu autorização para citar esta frase, e diz: “O uso desta citação irregular
e do nome de William Faulkner nesse filme tende a causar confusões, a causar
equívocos, e/ou enganar os espectadores do filme infrator levando-os a supor
uma afiliação, conexão ou associação entre William Faulkner e sua obra, de um
lado, e a Sony, do outro”. Isto equivale, grosso modo, àquelas cenas em que um
pirralho pega o trenzinho do outro para brincar, e o outro imediatamente
arrebata de volta o trenzinho e o desce com força na testa do provocador.
Fiquei mais tranquilo quando vi que o filme
arrecadou 94 milhões de dólares. O que recebo no Jornal da Paraíba não chega
nem à metade disso, de modo que eles provavelmente irão concentrar seus
esforços em cima do pobre Woody. Isto me lembra o episódio de um
álbum de fotografias que foi embargado aqui no Brasil pelos herdeiros de Manuel
Bandeira, que se queixavam de não ter recebido nem um tostão pelo fato do poeta
aparecer em uma das centenas de fotos que havia no álbum.
Se isso é “direito autoral”, amigos, a
minha vontade, a cada ano que passa, é arranjar um emprego burocrático (sou bom
datilógrafo!) e liberar tudo que escrevi até hoje, desde que seja para uso
não-comercial. Qualquer um pode gravar minhas músicas ou imprimir meus textos,
desde que ninguém ganhe dinheiro com isso. Direitos autorais são uma coisa
muito justa quando exprimem a remuneração de um autor pelo seu trabalho
intelectual e físico (sim, escrever envolve esforço físico), e ajudam a pagar
suas despesas. Faulkner ganhou o bastante, em vida, para beber tudo a que tinha
direito. As frases que escreveu se impregnaram na nossa linguagem diária (até
na minha, imagine só, eu que nunca li um só livro dele). A presença da frase de
Faulkner não influiu na bilheteria do filme de Allen, que com frase ou sem
frase seria exatamente a mesma. Agora... 94 milhões são 94 milhões, né? Acho
que vou ver o filme de novo, e vou entrar com um processo se Owen Wilson disser “eu vi o céu à meia
noite se avermelhando num clarão”.
Braulio
Tavares, in mundofantasmo.blogspot.com.br
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