quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Celebração da coragem - 1

Gabriel Caro, colombiano, que lutou na Nicarágua, conta que ao lado dele caiu um suíço, destrocado por uma rajada de metralhadora; e ninguém sabia como era o nome do suíço. Aconteceu na Frente Sul, um par de noites ao norte do rio San Juan, pouco antes da derrota da ditadura de Somoza. Ninguém sabia o seu nome, ninguém sabia nada daquele calado miliciano louro que tinha ido tão longe para morrer na Nicarágua, pela revolução, pela lua. O suíço caiu gritando uma coisa que ninguém entendeu, caiu gritando: — Viva Bakunin!
E enquanto ouço Gabriel contando a história do suíço, minha memória se acende. Há anos, em Montevidéu, Carlos Bonavita me falou de um tio dele, ou tio-avô, que redigia os relatos de batalha nos tempos das guerras gaúchas nas pradarias do Uruguai. Andava aquele tio ou tio-avô contando mortos na beira do rio onde uma batalha, não sei qual, tinha acontecido. Pela cor das fitas que os soldados usavam nos cabelos, reconhecia os grupos. Estava fazendo isso quando viu um cadáver e ficou paralisado. Era um soldado de poucos anos, era um anjo de olhos tristes. Sobre os cabelos negros, vermelhos de sangue, a fita branca dizia - Pela pátria e por ela. A bala tinha entrado na palavra ela.
Eduardo Galeano, in O livro dos abraços

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