quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Um disco fundamental da MPB: Jacob e seu Conjunto Época de Ouro - Vibrações (1967)


A música instrumental brasileira nas suas modalidades de representação teve e tem grandes intérpretes, contudo, precisa obter um pouco mais de visibilidade para que cada vez mais um número maior de ouvintes possam apreciá-la. Muitos desses notáveis músicos emprestam seu talento acompanhando artistas famosos e mesmo sendo por esses reconhecidos acabam no final tendo seu valor minimizado. Mesmo com dificuldades, o panorama da música instrumental no Brasil foi responsável por mudanças significativas no conceito de se ver, sentir e ouvir música, contribuindo para operar radicais transformações no tradicional comportamento da música popular brasileira, sem, contudo, perder a sua essência. A modernização e a valorização de novas sonoridades provocou um movimento renovador em nossa canção e nesse aspecto nomes como Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal passam, a partir da década de setenta, a comandar um movimento de renovação estética e conceitual da música instrumental, inserindo-a na contemporaneidade e nas aspirações de uma pesquisa mais profunda.
Mas se o resultado das experimentações perpetradas por esses dois músicos e por outros que seguiram suas propostas transgressoras/renovadoras foi aceita pela parcela da população que via ali um momento de ruptura com o tradicional, esses mesmos artistas perceberam que sem uma volta ao passado de nossas tradições musicais eles não conseguiriam realizar esse novo som retirando dela os elementos necessários para uma releitura. Um exemplo desse retorno ao tradicional com novas roupagens é a música Chorinho pra ele, de Hermeto Pascoal gravado no LP Slave mass em 1966 em Los Angeles nos Estados Unidos e lançado no Brasil apenas em 1977 quando esses novos sons ecoavam por todo o país.
Assim verificaremos que a base instrumental de nossa canção, apesar da introdução de novos elementos que a façam caminhar para uma renovação de ritmo e harmonia, acaba voltando-se para um princípio único que formou os alicerces de nossa musicalidade cabocla a partir da segunda metade do século XIX, o choro, esse gênero musical que se traduz como a expressão mais pura de um sentimento jocoso/lírico/sentimental/brasileiro. Um de seus representantes mais notáveis foi um músico excepcional, Jacob Pick Bittencourt ou simplesmente Jacob do Bandolim.
Consagrado como um dos maiores artistas brasileiros de todos os tempos, teve no choro a sua expressão máxima, compondo peças imortais e produzindo excelentes discos. Um desses trabalhos veio a público com a gravação em 1967 do LP Vibrações em que o mestre bandolinista se fazia acompanhar do Conjunto Época de Ouro por ele criado e formado por Horondino José da Silva, o Dino, no violão de 7 cordas, Benedito César Ramos de Faria, pai de Paulinho da Viola, e Carlos Fernandes de Carvalho Leite, no violão de 6 cordas, Jonas Pereira da Silva, no cavaquinho, Gilberto D'Ávila, no pandeiro e Jorge Jose da Silva como ritmista. Juntos esse time de craques entraram nos estúdios da RCA Victor no Rio de Janeiro e realizaram as doze gravações apresentadas no disco como se estivessem espontaneamente demonstrando seu talento em uma animada roda de choro.
No repertório são apresentadas até então três peças inéditas de Jacob do Bandolim, Vibrações, que dá título ao LP, Receita de samba e Pérolas, de Pixinguinha; temos Ingênuo e Lamento em exuberantes interpretações de Jacob, sendo que em Lamento podemos dizer que ele atinge o máximo de seu virtuosismo numa interpretação hoje clássica e nunca superada. De Luiz Americano, um de nosso mais completo clarinetista e saxofonista é apresentado o choro Assim mesmo. No intuito de valorizar músicos talentosos, mas pouco conhecidos Jacob e seu grupo apresentam o também inédito choro Cadência, do bandolinista Joventino Maciel. De Fon Fon, pseudônimo do saxofonista Otaviano Maciel, é o choro Murmurando onde se destaca na última parte o solo de Dino. Porém é de Ernesto Nazaré o maior número de composições do disco, contemplado com quatro obras, duas nunca gravadas e apresentadas pela primeira vez ao público, Fidalga e Vésper, a primeira editada em 1914 e a segunda em 1901. As outras são Floraux e Brejeiro, esta última um de nossos clássicos mais conhecidos.
Marco da discografia do choro, este disco de Jacob do Bandolim e seu Conjunto Época de Ouro merece um lugar de destaque nas prateleiras de todos os que verdadeiramente admiram a mais autêntica música popular brasileira aqui representada em sua essência genuinamente mais pura.
Luiz Américo Lisboa Junior, in www.luizamerico.com.br

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