sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A respeito das parábolas

Muitas pessoas se queixam de que as palavras dos doutos geralmente não passam de parábolas, não tendo a menor utilidade na vida quotidiana, que é a única que temos. Quando um sábio nos diz “Passe até lá”, ele não nos quer dizer que devamos ir até determinado lugar, o que poderíamos fazer se o esforço valesse a pena; “lá”, para ele, significa um além fabuloso, um sítio que desconhecemos e que ele próprio não pode indicar mais precisamente, estando por isso mesmo impossibilitado de nos dar a mínima ajuda.
Todas as parábolas, no fundo, servem apenas para confirmar que o incompreensível é de fato incompreensível, coisa que já sabíamos desde sempre. Mas as preocupações com que diariamente nos defrontamos constituem algo bem diferente.
A propósito disso, um homem certa vez disse: “Por que tanta relutância? Se vos dispusésseis a seguir as parábolas, vós mesmos vos transformaríeis nelas e, com isso, resolveríeis todos os vossos problemas quotidianos.”
Um circundante ouviu-o dizer tal coisa e logo acrescentou: “Aposto que isso também é uma parábola.”
O primeiro respondeu-lhe: “Pois já ganhou a aposta.”
O segundo prosseguiu: “Mas, infelizmente, apenas em parábola.”
O primeiro corrigiu: “Não, na realidade! Se fosse em parábola, tê-la-ia perdido.”
Franz Kafka, in Contos, fábulas e aforismos

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