O Rei fartou-se de
reinar sozinho e decidiu partilhar o poder com a Opinião Pública.
― Chamem
a Opinião Pública ― ordenou
aos serviçais.
Eles percorreram as
praças da cidade e não a encontraram. Havia muito que a Opinião Pública deixara
de frequentar lugares públicos. Recolhera-se ao Beco sem Saída, onde,
furtivamente, abria só um olho, isso mesmo lá de vez em quando.
Descoberta, afinal, depois
de muitas buscas, ela consentiu em comparecer ao Palácio Real, onde Sua
Majestade, acariciando-lhe docemente o queixo, lhe disse:
― Preciso
de ti.
A Opinião, muda como
entrara, muda se conservou. Perdera o uso da palavra ou preferia não
exercitá-lo. O Rei insistia, oferecendo-lhe sequilhos e perguntando o que ela
pensava disso e daquilo, se acreditava em discos voadores, horóscopos, correção
monetária, essas coisas. E outras. A Opinião Pública abanava a cabeça: não
tinha opinião.
― Vou
te obrigar a ter opinião ― disse
o Rei, zangado. ― Meus
especialistas te dirão o que deves pensar e manifestar. Não posso mais reinar
sem o teu concurso. Instruída devidamente sobre todas as matérias, e tendo
assimilado o que é preciso achar sobre cada uma em particular e sobre a
problemática geral, tu me serás indispensável.
E virando-se para os
serviçais:
― Levem
esta senhora para o Curso Intensivo de Conceitos Oficiais. E que ela só volte
aqui depois de decorar bem as apostilas.
Carlos Drummond de Andrade,
in Contos plausíveis
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