sábado, 10 de setembro de 2011

Celebração da realidade

Se a tia de Damaso Murua tivesse contado sua historia a Garcia Marquez, talvez a Crônica de uma morte anunciada tivesse outro final.
Susana Contreras, que é como se chama a tia de Damaso, teve em seus bons tempos a bunda mais incendiária de todas as que ondularam na cidadezinha de Escuinapa e em todas as comarcas do golfo da Califórnia.
Há muitos anos, Susana se casou com um dos numerosos galãs que sucumbiram ao seu remelexo. Na noite de núpcias, o marido descobriu que ela não era virgem. Então soltou-se da ardente Susana como se ela contagiasse de peste, bateu a porta e foi-se embora para sempre.
O despeitado desandou a beber nos botequins, onde os convidados da festa continuavam a farra. Abraçado aos amigos, ele se pôs a mastigar rancores e a proferir ameaças, mas ninguém levava a sério seu tormento cruel. Com benevolência o escutavam, enquanto ele segurava, macho forte, as lágrimas que aos borbotões lutavam para sair, mas depois lhe diziam que a notícia não era de nada, que não desse bola, que claro que Susana não era virgem, que a cidade inteira sabia menos ele, e que afinal esse era um detalhe que não tinha a menor importância, e deixa de ser babaca, meu irmão, que a gente só vive uma vez. Ele
insistia, e no lugar de gestos de solidariedade recebia bocejos.
E assim foi avançando a noite, aos trambolhões, em triste bebedeira cada vez mais solitária, até o amanhecer. Um atrás do outro, os convidados foram dormir. A alvorada encontrou o ofendido sentado na rua, completamente sozinho e exausto de tanto se queixar sem que ninguém desse atenção.
O homem já estava se cansando de sua própria tragédia, e as primeiras luzes desvaneceram a vontade de sofrer e de se vingar.
No meio da manha tomou um bom banho e um café bem quente e ao meio-dia voltou, arrependido, aos braços da repudiada.
Voltou desfilando, em passo de grande cerimônia, vindo lá da outra ponta da rua principal. Ia carregando um enorme ramo de rosas, encabeçando uma longa procissão de amigos, parentes e público em geral. A orquestra de serenatas fechava a marcha. A orquestra soava a todo vapor, tocando para Susana, a maneira de desagravo, La negra consentida e Vereda tropical. Com essas musiquinhas, tempos atrás, ele tinha se declarado a ela.

Eduardo Galeano, in O livro dos Abraços

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