sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Só o homem realiza o trabalho de um homem

Quando assumir os títulos “benigno,” “modesto,” “verdadeiro,” “racional,” “equânime,” e “magnânimo,” cuide para não os perder. Caso os perca, recupere-os rapidamente.
Lembre-se:
I. A racionalidade designa a atenção discriminativa a cada objeto e a abstenção da negligência.
II. A equanimidade é a aceitação voluntária das porções atribuídas pela natureza comum.
III. A magnanimidade é a elevação da parte inteligente acima das sensações prazerosas ou dolorosas da carne, da pobre fama, da morte e de trivialidades parecidas.
Caso os preserve — sem exigir que seja reconhecido por eles —, será outra pessoa e entrará em outra vida. Permanecer como tem sido até agora — e ser despedaçado e contaminado — é característico de um homem estúpido e apaixonado por viver. Seria comparável àqueles gladiadores parcialmente devorados por feras selvagens e cobertos por feridas e sangue: suplicam pela sobrevivência até o dia seguinte, embora serão expostos à mesma situação e às mesmas garras e presas.
Sendo assim, apoie-se nesses poucos títulos. Se estiver apto, permaneça com eles como se tivesse partido para a ilha dos bem-aventurados. Se notar que está perdendo eles e o controle, vá corajosamente para algum recanto onde possa recuperá-los ou parta de vez — sem paixões, com singeleza, liberdade e modéstia e completando, ao menos, um bom ato partindo desse jeito.
Recordar-se dos deuses ajuda a memorizar esses títulos. Desejam não a lisonja, mas sim que os seres racionais ajam como eles. Recorde-se: só a figueira frutifica figos, só o cão late, só a abelha produz mel e só o homem realiza o trabalho de um homem.

Marco Aurélio, em Meditações

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