5
Eram
doze horas por noite, mais os supervisores, mais os funcionários,
mais o fato de que você mal podia respirar naquele matadouro, mais a
comida intragável do refeitório “sem fins lucrativos”.
Mais
o PC1. Plano da Cidade 1. O esquema do posto não era nada em
comparação com o PC1 que continha cerca de um terço das ruas da
cidade e revelava o modo como eram divididas em números zonais. Eu
morava numa das maiores cidades dos Estados Unidos. Era um bocado de
ruas. Depois havia o PC2. E o PC3. Você tinha noventa dias para
passar em cada teste, três chances em cada um, 95 por cento ou mais,
cem cartas numa gaiola de vidro, oito minutos, e se você falhasse
eles o deixariam tentar ser presidente da General Motors, como o
homem tinha dito. Para os que conseguissem, os esquemas ficariam um
pouco mais fáceis, da segunda ou da terceira vez. Mas com as doze
horas por noite e os dias de folga cancelados, era demais para a
maioria. Àquela altura, do nosso grupo original de 150 ou 200,
haviam restado apenas dezessete ou dezoito.
— Como
posso trabalhar doze horas por noite, dormir, comer, tomar banho, ir
de lá para cá, pegar a roupa na lavanderia, cuidar do gás e do
aluguel, trocar pneus, fazer todas as pequenas coisas que têm de ser
feitas e ainda estudar o esquema? — perguntei a um dos instrutores
na sala de treinos.
— Faça
tudo isso sem dormir — ele me disse.
Olhei
para cara dele. Ele não estava tirando onda comigo. O cretino falava
sério.
6
Descobri
que o único tempo livre para estudar era antes de dormir. Eu estava
sempre cansado demais para preparar o café da manhã, e assim eu
saía e comprava meia dúzia de cervejas, as colocava na cadeira ao
lado da cama, abria uma lata, dava um bom gole e então abria a
apostila do método. Quando chegava à terceira lata de cerveja, eu
deixava cair a apostila. Mal conseguia chegar a tanto. Então eu
bebia o resto da cerveja, sentado na cama, olhando fixo para as
paredes. Com a última lata de cerveja eu caía no sono. E, quando
acordava, havia tempo apenas para ir ao banheiro, tomar banho, comer
e dirigir até lá.
E
não havia como se ajustar, você simplesmente ficava cada vez mais e
mais cansado. Eu sempre pegava a minha meia dúzia de cervejas no
caminho, e numa certa manhã percebi que estava, de fato, acabado.
Subi as escadas (não havia elevador) e pus a chave na fechadura. A
porta se escancarou. Alguém havia mudado toda a mobília do lugar,
colocado um novo tapete. Não, a mobília também era nova.
Havia
uma mulher no sofá. Tinha um bom aspecto. Jovem. Boas pernas. Uma
loira.
— Olá
— eu disse —, que tal uma cerveja?
— Oi
— ela respondeu. — Tudo bem, aceito uma.
— Gosto
do jeito como este lugar está arrumado — eu disse a ela.
— Fui
eu que o fiz.
— Mas
por quê?
— Me
deu vontade, ora.
Começamos
a mamar as cervejas.
— Você
é legal — eu disse. Pus a minha lata de cerveja de lado e lhe dei
um beijo.
Pus
a minha mão sobre um de seus joelhos. Era um joelho legal.
Em
seguida, dei outro gole na cerveja.
— Sim
— eu disse —, gostei muito do jeito como este lugar está
arrumado. Vai levantar o meu humor.
— Que
bom! Meu marido também gosta disso.
— Mas
o que seu marido tem a ver... O quê? Marido? Ei, qual o número
deste apartamento?
— 309.
— 309?
Meu Deus! Estou no andar errado! Moro no 409. Minha chave abriu a sua
porta.
— Sente,
docinho — ela disse.
— Não,
não...
Peguei
as quatro cervejas que sobravam.
— Por
que sair assim correndo? — ela perguntou.
— Alguns
homens são loucos — eu disse, indo em direção à porta.
— O
que você quer dizer?
— Quero
dizer, alguns caras são apaixonados por suas esposas.
Ela
riu.
— Não
esqueça onde eu moro.
Fechei
a porta e subi mais um lance de escadas. Então abri minha porta. Não
havia ninguém lá dentro. Os móveis eram velhos e estragados, o
tapete quase sem cor. Latas vazias de cerveja se espalhavam pelo
chão. Eu estava no lugar certo.
Tirei
minhas roupas, enfiei-me na cama e fiz estalar o lacre de outra
cerveja.
Charles Bukowski, in Cartas na Rua
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