“Considerareis
deplorável o fato do homem não ter asas para voar como os pássaros,
ou quatro pés como os quadrúpedes, ou
a fronte armada de chifres como o touro? Lamentareis a sorte de um
belo cavalo, pelo fato de não ter aprendido gramática ou de não
comer bem? Deplorareis um touro, pelo fato de não ser adestrado na
palestra?
Portanto, assim como o cavalo não é infeliz por ignorar a gramática, assim também não o é o louco, pois a loucura é natural no homem. Se bem que, com Platão, o provérbio de Alcebíades diga que a verdade se encontra no vinho e nas crianças, contudo é a mim, particularmente, que convém esse elogio, porque, segundo o testemunho de Eurípedes, tudo o que o tolo encerra no coração ele o traz também impresso na cabeça e o manifesta nas palavras. Mas, os sábios, segundo o mesmo Eurípedes, têm duas línguas, uma para dizer o que pensam e a outra para falar conforme às circunstâncias: quando o querem, têm talento para fazer o preto aparecer como branco e o branco como preto, soprando com a mesma boca o calor e o frio e exprimindo com palavras exatamente o contrário
do que sentem no peito.”
Erasmo
de Rotterdam, in Elogio da loucura
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