Doente
durante dez dias, fiquei de cama e faltei à escola. Meu pai
trouxe-me os votos de Kafka e, de sua parte, um volume de capa
colorida, da coleção Insel: Sobre os escritores e o Estilo,
de Arthur Schopenhauer.
Alguns
dias depois de minha cura, fui ao Instituto de Seguros Operários
contra Acidentes. O Dr. Kafka estava de ótimo humor. Quando eu lhe
disse que depois de minha doença me sentia muito mais forte do que
antes, um sorriso de encanto irresistível apareceu em seu rosto:
-
É compreensível – disse, você superou um encontro com a morte.
Isso dá força.
-
Toda a vida não passa de um caminho que conduz à morte –
observei.
Franz
Kafka olhou-me um momento com ar grave, depois, baixando os olhos
para sua mesa, disse:
-
Para a pessoa boa de saúde, a vida só significa de fato uma fuga
inconsistente e não-confessada diante da consciência de ter de
morrer um dia. A doença sempre é ao mesmo tempo uma advertência e
uma prova de força. É por isso que a doença, a dor e o sofrimento
são também as fontes mais importantes da religiosidade.
-
Como o senhor a entende? - perguntei.
Kafka
sorriu: - Entendo-a em termos judeus. Sou ligado a minha família, a
meu clã. Eles sobrevivem ao indivíduo. Mas isso também não passa
de uma tentativa e fuga diante da certeza da morte. Isso não passa
de um desejo, mas de maneira nenhuma de uma fonte de conhecimento. Ao
contrário… Por esse desejo, o pequeno Eu, temerosamente egoísta,
se coloca diante da alma à procura de verdade.
Gustav
Janouch, in Conversas com Kafka
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