sábado, 26 de outubro de 2024

Cartas na Rua | SEIS


6

Certa noite eu vinha pelo corredor, depois de escapulir até o refeitório para comprar um maço de cigarros. E lá estava um rosto que eu conhecia.
Era Tom Moto! O cara com quem tinha estagiado nos tempos do Stone!
Moto, seu filho da puta! — eu disse.
Hank! — ele disse.
Trocamos um aperto de mãos.
Ei, estava pensando em você! Jonstone está se aposentando este mês. Alguns de nós vão dar uma festa de despedida para ele. Você sabe, ele sempre gostou de pescar. Vamos levá-lo para um passeio num barco a remo. Talvez você queira vir junto para jogá-lo da borda, dar-lhe um caldo. Arranjamos um lago bem fundo.
Não, caralho, não quero nem olhar para ele.
Mas você está convidado.
Moto ria um riso estranho, que ia do cu às sobrancelhas. Então olhei para sua camisa: uma insígnia de supervisor.
Ah, não, Tom.
Hank, tenho quatro filhos. Precisam de mim para o pão com manteiga.
Tudo bem, Tom — eu disse.
Depois disso, me afastei.

7

Não sei como as pessoas resolvem essas coisas. Eu tinha que pagar uma pensão, precisava de grana para beber, para o aluguel, comprar sapatos, camisas, meias, todas essas coisas. Como todo mundo, precisava de um carro velho, de algo para comer, todos os pequenos gastos em coisas supérfluas.
Como mulheres.
Ou um dia no hipódromo.
Com todas essas coisas enfileiradas e nenhuma rota de fuga, você nem pensa nisso.
Estacionei o carro do outro lado da rua da Central e fiquei esperando o sinal mudar. Atravessei. Empurrei a porta giratória. Era como se eu fosse um pedaço de ferro atraído por um ímã. Não havia nada que eu pudesse fazer.
Era no segundo andar. Abri a porta e eles já estavam lá. Os empregados do Correio Central. Reparei em uma garota, coitadinha, que tinha apenas um braço. Ficaria ali para sempre. Era como ser um velho bebum como eu. Bem, como diziam os rapazes, você tinha que trabalhar em algum lugar. Então aceitavam o que aparecesse. Essa era a sabedoria do escravo.
Uma jovem negra se aproximou. Estava bem-vestida e satisfeita com o mundo ao seu redor. Eu estava feliz por ela. Eu teria enlouquecido nesse emprego.
Pois não? — perguntou.
Sou funcionário dos Correios — eu disse — e quero me demitir.
Ela se inclinou para baixo do balcão e voltou a aparecer com um maço de papéis.
Todos esses?
Ela sorriu:
Está seguro de como preenchê-los?
Não se preocupe — eu disse —, sei o que fazer.

Charles Bukowski, em Cartas na Rua

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