Las
Casas
Faz
tempo que espera, aqui no porto, tendo como única companhia o calor
e os mosquitos. Perambula pelo cais, descalço, escutando o vaivém
do mar e o golpear de seu cajado, passo a passo, sobre as pedras.
Ninguém oferece uma palavra ao recém-ungido bispo de Chiapas.
Este
é o homem mais odiado da América, o anti-Cristo dos senhores
coloniais, o açoite destas terras. Por sua culpa, o imperador
promulgou novas leis que despojam de escravos índios os filhos dos
conquistadores. O que será deles sem os braços que os sustentam nas
minas e nas lavouras? As novas leis estão arrancando a comida de
suas bocas.
Este
é o homem mais amado da América. Voz dos mudos, teimoso defensor
dos que recebem pior tratamento que o esterco das praças,
denunciador de quem por cobiça converte Jesus Cristo no mais cruel
dos deuses e o rei em lobo faminto de carne humana.
Nem
bem desembarcou em Campeche, frei Bartolomé de Las Casas anunciou
que nenhum dono de índios seria absolvido na confissão.
Responderam-lhe que aqui não valiam suas credenciais de bispo nem
valiam tampouco as novas leis, porque tinham chegado em letras de
forma e não de punho e letra dos escrivães do rei. Ameaçou com a
excomunhão, e deram risada. Riram forte, gargalharam, porque frei
Bartolomé tem fama de surdo.
Esta
tarde chegou o mensageiro da Cidade Real de Chiapas. O cabildo manda
dizer que estão vazios os cofres para pagar a viagem do bispo até
sua diocese, e manda-lhe moedas da cota de enterros.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
Nenhum comentário:
Postar um comentário