É
tão fácil enganar a mídia. Quando você ler que um artista
brasileiro faz sucesso no exterior, não acredite; o boi ronca. Lá
fora, somos uma massa anônima que, até há pouco tempo, se
envergonhava de não poder sacar um cartão de crédito
internacional. Na música, alguns fazem sucesso. Na literatura, Jorge
Amado é conhecido, Márcio de Souza tem um público cativo e Machado
de Assis tira o fôlego de alguns fãs; Warren Beatty é um deles. No
mais... Enganei muito jornalista com três fotos que tenho abraçado
a um prêmio Nobel, a um Oscar e a um Pulitzer. Hoje, confesso: pura
armação.
1.
Prêmio Nobel. Eu, Paulo Betti e uma atriz cubana (que eu não me
lembro o nome) conversávamos amenidades latinas num parque, em
Havana, quando vimos Gabriel García Márquez passar. Fomos atrás.
“Gabo, espere por nós...” Nos apresentamos. Ele parou. Só parou
para examinar de perto a atriz, morena charmosa que lhe deu toda a
atenção.
Não
me lembro de ter trocado uma palavra com o escritor colombiano. Tanto
eu quanto Betti estávamos mais preocupados em registrar o fato para
a posteridade, isto é, tirar uma foto. Demos a câmera para um
pedestre e fizemos a pose: eu, abraçado ao Betti, abraçado ao Gabo,
olhando encantado para a atriz, abraçada a ninguém. Olhando a foto,
qualquer jornalista diria que sou íntimo do escritor. A atriz sim,
já que foi passear com Gabo, enquanto eu e Betti corremos para
revelar tal preciosidade.
2.
Oscar. Eu estava numa livraria, em Roma, autografando Felice Anno
Vecchio, como o nome bem diz, tradução do meu afamado livro.
Devo ter dado, no máximo, cinco autógrafos, quando entrou por
acaso, na livraria, Bernardo Bertolucci. Minha tradutora ficou
histérica. Eu, pra falar a verdade, não o reconheci. Pobre coitado.
Tirou fotos com meus cinco leitores, com o staff da editora e,
lógico, comigo. Teve, ainda, de comprar um exemplar da minha obra,
no qual autografei “Un abraccio”. Trocamos palavras. Me
perguntou como andavam seus amigos do Cinema Novo. “Adeptos do
roteiro”, respondi. Ele riu. Disse que também aderira ao roteiro,
e se foi. Na foto, parecemos íntimos.
3.
Pulitzer. Nem sei se Tom Wolf ganhou o Pulitzer; pelo menos mereceu.
Estávamos em Frankfurt, na feira do livro. Eu, num hotel de quinta,
há três meses longe de casa, sem dinheiro. Ele, no hotel de luxo.
Nos encontramos no segundo, onde editores brasileiros me convidaram
para um drinque. Alguém nos apresentou. Meu editor tirou a foto.
Ele, um dândi. Eu, de tênis, com a roupa amassada, o terno rasgado,
barba por fazer, rindo como uma besta do branco de sua roupa. “Estou
lendo seu livro, não é uma coincidência?”, perguntei. Parei de
rir e me lembrei que muitos, no Brasil, falam o mesmo quando me
encontram, e que nunca acredito. Brasil. Tão longe; uma incógnita.
“O sertão é o mundo”, mas o mundo desconhece o sertão.
Marcelo Rubens Paiva, in Crônicas para ler na Escola
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