terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Emoções mistas

As histórias evolutivas do riso e do sorriso mostram como Jan estava certo ao propor origens separadas para os dois. Eles se originam de diferentes cantos do espectro da emoção. Um começou como uma expressão de medo e submissão, que se tornou um sinal de não hostilidade e, por fim, de afeição. O outro começou como um indicador de brincadeira sensível a bagunça e cócegas, depois se transformou num sinal de vínculo e bem-estar, até de diversão e felicidade. Ambas as expressões têm se aproximado em nossa espécie, e, como muitas vezes misturamos emoções, elas acabaram se fundindo. Com frequência, passamos de um sorriso para uma risada e vice-versa, ou mostramos misturas dos dois.
Expressões misturadas são típicas dos hominídeos, a pequena família de primatas dos seres humanos e símios. Enquanto a maioria dos outros animais, inclusive macacos, tem vozes e exibições distintas, os hominídeos se destacam por sua comunicação matizada. Um macaco faz uma cara de ameaça, um sorriso de dentes à mostra ou uma cara de quem quer brincar, mas não uma combinação ou mistura dessas expressões. Seus sinais são fixos e estereotipados, bastante separados uns dos outros, como se fossem ou azuis, ou vermelhos, nunca roxos. Trata-se de uma limitação séria em comparação com os grandes primatas, que facilmente se movem entre uma cara de beicinho, um gemido e um grito de dentes à mostra. Suas faces estão em constante movimento para cobrir uma ampla gama de tendências, mesmo que conflitivas. Da mesma forma, uma criança pode chorar, depois rir em meio às lágrimas, depois chorar mais.
Usando uma classificação de 25 expressões faciais, analisamos literalmente milhares delas na colônia de chimpanzés de Yerkes durante sua vida cotidiana em seu recinto ao ar livre. Percebemos um enorme grau de matizes e misturas. Por exemplo, um macho jovem que procura contato com o macho alfa tem medo e senta-se à distância, esperando por um sinal simpático. O jovem macho faz sinais amistosos, como estender a mão ao seu líder com arquejos rápidos, mas também grunhidos submissos para demonstrar respeito. Ou uma fêmea está interessada na melancia suculenta de outro, mas fica aborrecida quando é rejeitada e hesita entre implorar e protestar em voz alta, o que pode desencadear uma briga. Ela se move entre beicinhos e gemidos para pedir comida e entre uivos e gritos suaves que traem a crescente frustração. As interações sociais estão cheias dessas tendências conflitantes, e as faces dos seres humanos e dos símios revelam todas elas. Eles mostram não apenas um instantâneo de uma emoção ou outra, mas todos os tons sutis entre elas. Estados emocionais independentes são raros, motivo pelo qual é tão problemático pôr as expressões faciais em caixinhas rotuladas como “irritado”, “triste” ou outras emoções básicas. Isso não funciona para nós, nem para nossos companheiros hominídeos.

Frans de Waal, in O último abraço da matriarca

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