quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Sei que choveu à noite

Sei que choveu à noite. Em cada poça há um brilho azul e nítido.
Sobre as telhas, os diabinhos invisíveis do vento escorregam num louco tobogã.
Um mesmo frêmito agita as roupas nos varais e os brincos nas orelhas...
Ó ânsia aventureira! Parece que surgem bandeirolas
nos dedos mágicos dos inspetores do tráfego...
Ah, que vontade de desobedecer os sinais!
E mesmo as escolas, onde agora está presa a meninada,
nunca essas escolas rimaram tão bem com opressivas gaiolas...
Só deveria haver escolas para meninos-poetas,
onde cada um estudasse com todo o gosto e vontade
o que traz na cabeça e não o que está escrito nos manuais.
E, se duvidares muito, daqui a pouco sairão voando todas as gravatas-borboletas,
enquanto os seus donos atônitos aguardam o sinal verde nas esquinas.
Decerto elas foram em busca de novos ares...
Mas sossega, coração inquieto.
Não vês? Sob o azul cada vez mais azul,
a cidade lentamente está zarpando para um porto fantástico do Oriente.
Mário Quintana

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