A
Maria Helena engravidou, era o primeiro filho e ela ficou muito
emotiva. O Raul descobriu isso um dia quando entrou na cozinha e a
encontrou sentada na frente de uma torrada, chorando. Levou um susto:
— O
que foi?!
A
Maria Helena nem podia falar.
— Que
foi, Maria Helena? Tá sentindo alguma coisa?
A
Maria Helena soluçava. Sacudiu a cabeça. Apontou para a torrada e
conseguiu dizer:
— Essa
torrada!
— O
que que tem a torrada?
Ela
estava começando a se controlar.
— Não
tem nada. É que eu vi a torrada, assim, no prato...
E
Maria Helena caiu de novo num choro convulsivo. Só muito depois pôde
explicar que a torrada, daquele jeito, a deixara comovida.
— Que
jeito, Maria Helena?
— Assim,
no prato. Sozinha. Com as bordas queimadas, coitadinha. Sei lá,
eu...
O
choro não deixou Maria Helena terminar.
No
outro dia foi uma nuvem. Maria Helena chamou o marido para ver pela
janela. Uma nuvenzinha cor-de-rosa, no fim do dia. Tão... tão... E
o Raul teve que amparar a mulher, que chorava de ganir contra o seu
peito.
Passou
todo mundo a esperar as crises emotivas da Maria Helena. O Raul
telefonava para os amigos. Contava:
— Desta
vez foi aquele comercial da TV. Dos detergentes. Ela ficou com pena
do que não lavava tão branco. Chorou a noite inteira!
Mas
o cúmulo foi quando, numa reunião, o Almir mostrou o celular novo
que tinha comprado, um pequenininho que cabia no bolso da camisa. A
Maria Helena não aguentou. Tiveram que trazer água para acalmá-la.
Ela repetia “Que coisa mais querida, que coisa mais querida”. E o
pior é que sua emoção era contagiante. Já tinha mais gente com
lágrimas nos olhos, enternecida, sem saber por quê, com o
celularzinho do Almir. A reunião acabou.
O
Raul não vê o dia de o bebê nascer.
Luís
Fernando Veríssimo, in Amor veríssimo
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