O
devastador Melgarejo caiu. Fugiu da Bolívia, perseguido a pedradas
pelos índios, e vive mal em seu exílio num quartinho nos subúrbios
de Lima. Do poder, não lhe sobra mais que o poncho cor de sangue.
Seu cavalo, Holofernes, foi morto pelos índios, que cortaram suas
orelhas.
Passa
as noites uivando na frente da casa dos Sánchez. O lúgubre vozeirão
de Melgarejo faz tremer Lima.
Juana
não abre a porta. Juana tinha dezoito anos quando chegou ao palácio.
Melgarejo trancou-se com ela três dias e três noites. Os guardas da
escolta escutaram gritos, golpes, suspiros, gemidos, nenhuma palavra.
Ao quarto dia, Melgarejo emergiu:
– Gosto
dela tanto quanto do meu exército!
A
mesa dos banquetes converteu-se em altar. Ao centro, entre círios,
Juana reinava nua. Ministros, bispos e generais rendiam homenagem à
bela e caíam de joelho quando Melgarejo alçava uma taça de
conhaque em chamas e cantava versos de devoção. Ela, de pé, de
mármore, sem outra roupa que seus cabelos, desviava o olhar.
E
calava. Juana calava. Quando Melgarejo saía em campanha militar,
deixava-a trancada num convento de La Paz. Voltava ao palácio com
ela nos braços e ela calava, mulher virgem cada noite, cada noite
nascida para ele. Nada disse Juana quando Melgarejo arrancou dos
índios as terras das comunidades e deu de presente oitenta
propriedades e uma província inteira para a família dela.
Também
agora cala Juana. Trancada com pedra e cal a porta de sua mansão em
Lima, ela não se mostra nem responde aos desesperados rugidos de
Melgarejo. Nem sequer lhe diz:
– Nunca
me tiveste. Eu não estava ali.
Chora
e berra Melgarejo, seus punhos como trovões contra a porta. Nesse
umbral, gritando o nome dessa mulher, morre em 1871, com dois tiros.
Eduardo
Galeano, in Mulheres
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