sábado, 18 de julho de 2015

A gravidade do pecado

Finalmente, alguns cogitaram que a gravidade do pecado participasse da medida dos delitos. A falácia dessa opinião saltará aos olhos de um examinador imparcial das verdadeiras relações entre os homens e entre estes e Deus. As primeiras são relações de igualdade. A necessidade, e ela só, fez nascer do choque das paixões e da oposição dos interesses a ideia da utilidade comum, que é a base da justiça humana; as últimas são relações de dependência de um Ser perfeito e criador, que reservou a si só o direito de legislar e julgar ao mesmo tempo, pois só Ele pode fazê-lo sem inconveniente. Se estabeleceu penas eternas para quem desobedecer à Sua onipotência, qual será o inseto que ousará suprir a justiça divina, querendo vingar o Ser que basta a si mesmo e que não pode receber dos objetos nenhuma impressão de prazer ou de dor, e que, único entre todos os seres, age sem reação? A gravidade do pecado depende da imperscrutável malícia do coração, a qual não pode ser conhecida por seres finitos, sem uma revelação. Como, pois, poderia essa malícia constituir-se em norma para a punição dos delitos? Nesse, caso, poderiam os homens punir quando Deus perdoa, e perdoar quando Deus pune. Se os homens podem estar em contradição com o Onipotente ao ofendê-lo, podem também contradizê-lo ao punir.”
Cesare Beccaria, in Dos delitos e das penas

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