[Para
Douglas Blazek]
25
de agosto de 1965
[...]
escrevi ao Henry Miller outro dia pra arrancar 15 pratas de um
patrocinador dele que prometeu o mesmo se eu enviasse ao Henry mais 3
Crucifixos. eu vendo barato ao Stuart e dá pra comprar uísque e
apostar nuns cavalos. tipo eu tenho uma conta de conserto do freio de
$70. o carro não vale isso. de todo modo, eu estava bêbado e inferi
que Henry podia sacudir seu patrocinador em sua árvore de dinheiro.
os 15 chegaram de uma fonte hoje e a carta de Miller de outra:
citação parcial: “Espero que você não esteja bebendo até a
morte! e especialmente que não fique bebendo enquanto escreve. É um
jeito certeiro de matar a fonte da inspiração. Beba só quando
estiver feliz, se puder. Nunca para afogar suas mágoas. E nunca beba
sozinho!” claro que eu não engulo nada disso. eu não me preocupo
com a inspiração. quando a escrita morre, ela morre; foda-se. eu
bebo pra tocar em frente um outro dia. e descobri que a melhor
maneira de beber é beber SOZINHO. mesmo com esposa e criança em
volta, bebo sozinho. lata após lata misturada com meio litro ou um
quarto de litro. e eu me estico de parede a parede na luz, sinto como
se eu fosse todo cheio de carne e laranjas e sóis ardentes, e o
rádio toca e talvez eu mande ver na máquina e olho embaixo o oleado
rasgado e manchado de tinta na mesa da cozinha, uma mesa de cozinha
no inferno; uma vida, não uma estação no inferno; o fedor de tudo,
eu envelhecendo; pessoas se transformando em verrugas; tudo indo,
afundando, 2 botões na camisa faltando, barriga em desenvolvimento;
dias de bordoadas obtusas e árduas à frente – horas correndo à
toa com as cabeças cortadas, e eu levanto a bebida, boto a bebida
pra dentro, a única coisa a fazer, e Miller pede que eu me preocupe
com a fonte da INSPIRAÇÃO? não consigo olhar para nada, realmente
olhar para qualquer coisa sem querer me rasgar no meio. beber é uma
forma temporária de suicídio em que sou autorizado a me matar e
depois voltar à vida outra vez. beber é só um pouco de cola para
segurar meus braços e minhas pernas e meu pau e minha cabeça e o
resto. escrever é só uma folha de papel; eu sou algo que anda pra
lá e pra cá e olha pela janela. Amém.
Charles Bukowski, in Sobre bêbados e bebidas
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