sábado, 9 de janeiro de 2021

Do verbo

E assim continua a insinuante vírgula dos descaminhos portentosos de um ponto travesso que, descuidadamente, atravessa a vereda apaixonada das reticências, tal um amor descontínuo, imagem de estrábicas tataranas todas perfiladas em Riobaldo, ser curvado no rio afogueado da hora mais longa de todas as esperas, o verbo Diadorim, que de semente em semente sente a chegada das eternas primaveras do delírio. Perigoso, sim, conjugar é sempre muito perigoso, ainda mais, quando as inclinações soam múltiplas, e são ar de ir a verdades ora em er ora em or de primeiras, segundas e terceiras águas. O verbo na encruzilhada do paraíso. Quem bate na porta do purgatório esbarra e sobrevive aos infinitos infernos do silêncio, grandes verbos são aventuras de férteis silêncios: uma hora em ar outra hora em ir, o ser que beira-rio e lambe estrelas cadenciadas pelo ritmo dos olhos amojados de ternura. Na arcaizante flor do verbo, campos gerais incendeiam cantigas de outras paragens. Cada verbo, dito ou silenciado, é imagem travestida em volúpia, olhar de Riobaldo trespassando o corpo de Diadorim – rio de sonhos na tempestade ausente da cópula: o verbo que de alma faz-se corpo em combustão.

R. Leontino Filho, in As ruas arejadas do verbo impuro

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