Foto: Claudio Edinger
Um
cronópio vai abrir a porta da rua e ao enfiar a mão no bolso para
pegar a chave o que tira é uma caixa de fósforos; então este
cronópio fica muito aflito e começa a pensar que se em vez da chave
ele encontra os fósforos, seria terrível que o mundo se houvesse
deslocado de repente, e então se os fósforos estão no lugar da
chave, pode acontecer que ele ache a carteira de dinheiro cheia de
fósforos, e o açucareiro cheio de dinheiro, e o piano cheio de
açúcar, e o catálogo do telefone cheio de música, e o armário
cheio de assinantes, e a cama cheia de roupas, e as jarras cheias de
lençóis, e os bondes cheios de rosas, e os campos cheios de bondes.
Assim este cronópio fica horrivelmente aflito e corre para se olhar
no espelho, mas como o espelho está um pouco de lado, o que ele
enxerga é o porta-guarda-chuvas do vestíbulo, e suas desconfianças
se confirmam e ele desata a soluçar, cai de joelhos e junta suas
mãozinhas nem sabe para quê. Os famas vizinhos acodem para
consolá-lo, e também as esperanças, mas passa-se muito tempo antes
de que o cronópio saia de seu desespero e aceite uma xícara de chá,
que olha e examina muito antes de beber, não vá acontecer que em
lugar de uma xícara de chá seja um formigueiro ou um livro de
Samuel Smiles.
Julio
Cortázar, in Histórias de Cronópios e de Famas
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