Certa
vez, numa sombra em Niassa, eu trocava uns nadas com um velho
camponês. Um homem sabedor das suas coisas, em seu mundo. Foi ele
que me disse nesse português que ele mesmo chamava de “português
corta-mato”, foi ele que me disse algo que aproveitei, mais tarde,
em livro. Perguntou-me: “Sabe qual a diferença entre um sábio
branco e um sábio preto? Ora, o sábio branco é o primeiro a
responder, o sábio preto é o que mais demora a dar resposta. Às
vezes quando ele responde já ninguém mais se lembra qual era a
pergunta”.
Lembro-me
ainda de que eu e esse velho ficamos em silêncio durante um tempo.
Naqueles lugares o silêncio não suscita qualquer embaraço nem é
um sinal de solidão. O silêncio é, tanto quanto a palavra, um
momento vital de partilha de entendimentos. Estávamos numa dessas
pausas quando ele me perguntou:
— O
senhor não sabe falar nada de xi-djaua?
— Nem
uma palavra, Saide.
— Está
a ver a diferença entre nós?
— Estou,
sim. Nós falamos diferente. — Não, o senhor não está a ver. A
diferença entre nós não está no que falamos. A diferença está
em que eu sei ficar calado em português e o senhor não sabe ficar
calado em nenhuma língua.
Mia
Couto, in E se Obama fosse africano?
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