“O homem não é conhecível a si próprio, porque a
sua vida consiste em esforços alternados
para ser o que não é, e essa transposição e substituição contínuas de almas
irreais e estranhas fazem com que aquilo que na verdade e, ao contrário de
Deus, pareça o que nunca é. Mesmo no mais pobre de nós existem pelo menos sete
homens.
Há
aquele que parece aos outros e o julgado, justamente, sabe quase
sempre que não é.
Há
aquele que diz ser e ele próprio sabe não ser, porque a vaidade ou
medo tornam sempre mentiroso.
Há
aquele que julga ser e é o mais distante da verdade, que cada um se
inclina para se julgar aquilo que não é, por uma retorsão do orgulho que afasta
tudo o pior, que é a maioria.
Há
aquele que quereria ser, o mito pessoal de todo o homem, o sonho
reservado ao futuro, aquele que depois deforma todas as autobiografias.
Aquele
que finge ser para comodidade e necessidade da vida comum, onde o
insensível deve mostrar-se caloroso, o avarento liberal e o vil corajoso.
Há
aquele que se poderia chamar o nosso duplo desconhecido: a personalidade
subconsciente, que só conhecemos vagamente e por suposição, embora oriente com
frequência a nossa vida e sugira, valendo-se hipocritamente de razões fingidas,
muitos dos nossos atos.
E,
finalmente, há aquele que é verdadeiramente e ninguém conhece, à
parte Deus, do qual apenas um inimigo paciente pode entrever algumas fracções
inferiores.
O eu essencial e autêntico esquiva-se
sempre, a tudo e a si próprio. Nunca nos assemelhamos a nós mesmos."
Giovanni Papini,
in Relatório Sobre os Homens
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