quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Cartas na Rua | SEIS


3

Mas havia um pouco de ação. Um cara foi flagrado na mesma escadaria em que eu tinha me trancado. Foi pego lá com a cabeça debaixo da saia de uma garota. Então uma das garotas que trabalhava no refeitório reclamou que não tinha sido paga conforme prometido, por um pouco de sexo oral que ela tinha praticado com um gerente de seção e três carteiros. Demitiram a garota e os três carteiros e rebaixaram o gerente a supervisor.
Foi quando botei fogo nos Correios.
Eu havia sido mandado para as correspondências de quarta categoria e estava fumando um charuto, tirando um maço de correspondências de um carrinho quando um cara se aproximou e disse:
EI, SUAS CARTAS ESTÃO PEGANDO FOGO!
Olhei em volta. Ali estava. Uma pequena chama começava a se erguer como uma cobra bailarina. Evidentemente, um pouco de cinza em brasa do charuto tinha caído ali antes.
Puta merda!
A chama se alastrou depressa. Peguei um catálogo e, mantendo-o esticado, bati sobre o foco. Faíscas voaram. Estava quente. Tão logo apaguei uma parte, outra pegou fogo.
Escutei uma voz:
Ei! Sinto cheiro de fogo!
NÃO SE SENTE CHEIRO DE FOGO — gritei —, SENTE-SE CHEIRO DE FUMAÇA!
Acho que vou dar o fora daqui!
Foda-se, então — gritei —, DÊ O FORA!
As chamas queimavam minhas mãos. Eu tinha que salvar os Correios dos Estados Unidos, todo aquele lixo de correspondências de quarta classe.
Finalmente, consegui controlar o incêndio. Usando o pé, empurrei a pilha inteira de papéis para o chão e pisei no último foco de cinza vermelha.
O supervisor se aproximou para me dizer alguma coisa. Fiquei ali parado, o catálogo queimado na mão, a esperá-lo. Ele me olhou e se afastou.
Depois disso, retomei a organização daquele lixo de correspondência de quarta classe. Separava tudo que estivesse queimado.
Meu charuto tinha morrido. Não voltei a acendê-lo.
Minhas mãos começaram a doer e fui até o bebedor, coloquei-as debaixo d’água. Não ajudou.
Encontrei o supervisor e pedi-lhe uma dispensa para ir até a sala da enfermeira.
Era a mesma que costumava ir à minha porta perguntar:
Qual é o problema agora, sr. Chinaski?
Quando entrei, ela disse a mesma coisa de novo.
Lembra-se de mim, não é? — perguntei.
Ah, sim, sei que o senhor teve umas noites realmente doentes.
Ô — eu disse.
Ainda há mulheres lá no seu apartamento? — perguntou.
Sim. Há homens no seu?
Tudo bem, sr. Chinaski, o que o traz aqui?
Queimei minhas mãos.
Deixe eu ver. Como queimou as mãos?
Isso importa? Elas estão queimadas.
Ela começou a passar alguma coisa nas minhas mãos. Um de seus peitos roçou em mim.
Como aconteceu, Henry?
Charuto. Eu estava parado perto de um carrinho da quarta classe. Deve ter caído brasa ali dentro. As chamas subiram.
O peito voltou a roçar em mim.
Mantenha suas mãos paradas, por favor!
Então ela apoiou todo o flanco contra mim enquanto espalhava uma pomada em minhas mãos. Eu estava sentado num banco.
Qual é o problema, Henry? Você parece nervoso.
Bem... você sabe como é, Martha.
Meu nome não é Martha. É Helen.
Vamos nos casar, Helen?
O quê?
Quero dizer, quando vou poder voltar a usar minhas mãos?
Pode usá-las agora mesmo se tiver vontade.
O quê?
Quero dizer, no trabalho.
Ela as enrolou com umas gazes.
Sinto-me melhor — eu disse.
Você não devia queimar as cartas assim.
Era só lixo.
Toda correspondência é importante.
Tudo bem, Helen.
Ela voltou à sua mesa e eu a segui. Preencheu a folha de dispensa. Estava muito bonita em seu pequeno chapéu branco. Eu teria de encontrar um jeito de voltar aqui.
Ela me viu olhando para seu corpo.
Muito bem, sr. Chinaski, acho que é melhor o senhor ir agora.
Ah, sim... Bem, obrigado por tudo.
Faz parte do serviço.
Claro.

Charles Bukowski, em Cartas na Rua

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