Estou
ainda em Marabá, participando da IV Feira de Livros. Tiram fotos.
Costumo ser muito simpático em fotos. Repetem as fotos. Quando
repetem, já não estou tão simpático. Meus leitores vão embora.
Olho o relógio. Tenho ainda meia hora.
De
volta à solidão, ela vem devagar, passos candentes, aproxima-se, e
não pede autógrafo, fotos, nada. Entra sem ser convidada, a
conhecida depressão. Abaixo a cabeça e tenho vontade de queimar
tudo, de ter um ataque fulminante, de virar a mesa, gritar: “Para
que serve esta merda toda, a tal literatura?! Vão embora!”
Escreve-se para quem? Para alguém. Mas escreve-se para alguém ou
para um só? Sempre me perguntam: “Você, quando escreve, pensa no
público?” Não sei responder. Não sei por que escrevo. E daí que
escrevo, grande coisa. Ninguém pergunta: “Você faz este macarrão
pensando no seu público?” Escrevi, e minha vida mudou? Pari, e
nasceu o quê? Por que gastar anos, suor, para isso?
Alguém
me chama. Levanto a cabeça. Um repórter de rádio. Visto o
disfarce, guardo a depressão no bolso e sorrio. “Marcelo, você me
fez perder um jantar.” Jantar?! Será que o conheço e o deixei
esperando em algum restaurante? Dei algum cano nele? Ante as minhas
dúvidas, ele logo esclarece: “Fiquei lendo o seu livro e o jantar
queimou.” Ah, um leitor estilo íntimo. Ri bem efusivamente para
ser simpático. Ah, ah, ah... Que gracinha. Aponta para o livro Feliz
Ano Velho e diz: “Assisti ao seriado.” Seriado?! Que
seriado?! Virou filme, peça, camiseta, audiobook, bóton,
anúncio de computador. Mas seriado?! Minha vida não vale tanto.
Me
pergunto por que comecei a escrever, por que publiquei um livro e por
que não fiquei quieto, no meu canto. Passo a invejar Salinger, autor
de O Apanhador no Campo de Centeio, que não dá entrevistas,
não se deixa ser fotografado e mora numa montanha, aposentado,
depois de ter escrito quatro livros. Passa o dia cortando lenha e
nunca mais escreveu.
Leitores
invasores; querem me retalhar! Consumam, consumam, consumam. “Vai
ficar até quando?” “Você é de São Paulo?” “Te vi na
televisão.” “Você, você, você, me dá um autógrafo, me dá
uma foto, me dá um sorriso, me dá!”
Vou-me
embora com a minha tiete dessas horas: a depressão. Recito o meu
mantra preferido: “Eu vou parar, um dia paro, eu vou parar...”
Marcelo Rubens Paiva, in Crônicas para ler na Escola
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