Traição,
remorso e redenção se combinam na origem deste hino informal da
Portela e um dos maiores sambas de todos os tempos. A história
começa em 1968, quando o portelense da gema Paulinho da Viola (1942)
musicou “Sei lá, Mangueira”, uma letra de Hermínio Bello de
Carvalho, que planejava incluir o samba num show celebrando a verde e
rosa. Mas Paulinho foi surpreendido pela notícia de que o poeta
mudara de ideia. Percebendo a força do novo samba, Hermínio o
inscreveu no IV Festival da Música Popular Brasileira, na TV Record,
em que foi interpretado por Elza Soares. Sucesso imediato, deixou em
pânico Paulinho, então presidente da ala de compositores da
Portela: o que diriam seus colegas na escola de Oswaldo Cruz dessa
declaração de amor à rival?
Perturbado
com a repercussão da música na Portela, coração dividido e réu
confesso, o jovem sambista só pensava naquilo. Até que, certa
tarde, caminhando pelo Centro do Rio, este clássico em formato de
samba-enredo, com uma longa letra de 29 versos, começou a brotar em
sua cabeça e em seu coração azul e branco. Normalmente vagaroso no
compor, Paulinho criou “Foi um rio que passou em minha vida” de
uma lavada só, traduzindo plasticamente a sua sensação ao assistir
a um desfile da Portela: “… aquele azul / não era do céu / nem
era do mar / foi um rio que passou em minha vida / e o meu coração
se deixou levar.”
Gravada
em 1969, saiu inicialmente num compacto duplo feito para lançar
“Sinal fechado”, a canção vencedora naquele ano do V Festival
da Record. Mas fez tanto sucesso que, no ano seguinte, “Foi um rio
que passou em minha vida” voltou e deu nome ao segundo álbum solo
de Paulinho, tornando-se o maior sucesso de sua carreira.
No
carnaval de 1970, por sugestão do então presidente da Portela,
Natal, o samba foi cantado antes do início do desfile. Desde então,
“Foi um rio…” virou uma espécie de amuleto sonoro, esquentando
a entrada da escola na avenida a cada carnaval, número obrigatório
nos ensaios na quadra ou, seja qual for a agremiação, em qualquer
roda de samba que se preze.
Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil
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