— Vá um homem envelhecendo, e caia na
tolice de pensar que envelhece por inteiro — famosa tolice. Alguém
já notou: envelhecemos nisto, não naquilo; este trecho ainda é
verde, aquele outro já quase apodrece; aqui há seiva estuando, além
é coisa murcha.
A infância não volta, mas não vai —
fica recolhida, como se diz de certas doenças.
Pode dar um acesso. Outro dia sofri um
ataque não de infância, mas de adolescência: precipitei-me célere,
árdego, confuso. Meus olhos estavam úmidos e ardiam; mãos
trêmulas; os demônios me apertavam a garganta; eu me sentia
inibido, mas agia com estranha velocidade por fora.
Exatamente o contrário do que convém a
um senhor de minha idade e condição.
Pior é ataque de infância: o
respeitável cavalheiro de repente começa a agir como um menino
bobo. Será que só eu sou assim, ou os outros disfarçam melhor?
Rubem Braga, in Recado de primavera
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