Por coincidência, tive e tenho amigas
que são ou foram analisadas pelo Dr. Lourival Coimbra, psicanalista
do grupo de Melanie Klein. As conhecidas e amigas me contaram que
falaram de mim a ele. E imagino como Dr. Lourival deve estar farto de
ouvir meu nome. Há dias uma das analisadas por ele esteve aqui em
casa e resolvi, como compensação ao desgaste dos ouvidos do
analista sobre mim, enviar-lhe um livro meu de contos, Laços de
família. Na dedicatória pedi desculpas pela minha letra que não
está boa desde que minha mão direita sofreu o incêndio.
Dias depois a moça apareceu em casa para
tomar um café comigo e perguntei-lhe se havia entregue o livro a Dr.
Lourival. Ela disse que sim e que, ao ler a dedicatória, ele fizera
um comentário. Fiquei curiosa, quis saber o que ele dissera. E
fiquei sabendo que, ao ler a dedicatória, Dr. Lourival tinha dito:
“Clarice dá tanto aos outros, e no entanto pede licença para
existir.”
Sim, Dr. Lourival. Peço humildemente
para existir, imploro humildemente uma alegria, uma ação de graça,
peço que me permitam viver com menos sofrimento, peço para não ser
tão experimentada pelas experiências ásperas, peço a homens e
mulheres que me considerem um ser humano digno de algum amor e de
algum respeito. Peço a bênção da vida.
Clarice Lispector, in Todas as crônicas
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