“A minha vida foi
um romance”, diziam, depois de uma pausa e um suspiro, aquelas
velhinhas que apareciam antigamente nos lares a vender rendas e
bordados. Não sei por que os de casa desconversavam. Por sinal que
anos depois escrevi, para as consolar postumamente, um poema que
começava assim: “Minha vida não foi um romance”...
Não, a vida nunca
é um romance: falta-lhe o senso da composição, o crescendo que
leva ao clímax. Tudo acontece tão sem lógica e sem preparo que os
seus golpes nos deixam atônitos mas de olhos secos, como se fôssemos
heróis, nós que enxugamos furtivamente os olhos no escuro das salas
dos cinemas — só porque o diretor do dramalhão soube desenrolar
devidamente o filme.
Mário Quintana, in A vaca e o hipogrifo
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