sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Socorro! Eu não nasci para ser fitness!

          Ei você!
Você, que passou cerca de 15 anos da sua vida fugindo das aulas de educação física. Enfermaria, cantina, banheiro, qualquer escapatória era válida.
Você, que quando não conseguia fugir era sempre o último a ser escolhido para compor as equipes para jogar bola.
Até por isso, a única modalidade na qual você se dava minimamente bem na escola era queimado, porque a única coisa que precisava fazer era fugir da bola, sua especialidade até os dias de hoje.
Os anos passaram e você se livrou desse inferno. Que alívio.
Ou não.
Agora, se bobear, piorou: você paga uma academia sem que ninguém te obrigue a isso. E eu sei bem como é ser uma dessas pessoas que se sentem mais à vontade num terreiro de candomblé, num centro cirúrgico ou numa mina de sal do que numa academia. É realmente um sacrifício.
O pânico já começa na hora de se vestir. Se você é mulher, entrar num legging dá mais medo do que entrar em estacionamento de shopping perto do Natal. Quando enfia os pés dentro dele, sua sensação é de que precisava de um número 11 vezes maior e de que se você entrar naquilo nunca mais vai sair, nem com vaselina.
Se você é homem, dry fit é um termo absolutamente desconhecido e sua tendência natural é ir à academia sensualizando de moletom cinza com elástico na barra e camiseta de vereador. E, em ambos os casos, gastar mais do que 150 reais num tênis soa como uma verdadeira aberração. (“Gente, com 150 reais dá pra comer TAAANTO hambúrguer!”)
Muito bem, se você vence essa etapa, o que em muitos casos nem chega a acontecer, o negócio começa a ficar sério.
O problema já começa pelo verbo. Você se sente muito ridículo dizendo que vai “treinar”. Cara, eu nem tenho um treino. “Malhar” é pior ainda, fora de cogitação. Sua tendência é dizer que vai “fazer ginástica”, mas não dá, a não ser que você vá até a década de 1990 para se exercitar. O jeito é “ir para a academia” mesmo, com o máximo de dignidade possível.
Então você chega naquele local nefasto, faz uma breve oração para que ninguém te dirija a palavra enquanto você estiver lá dentro, respira fundo, pensa em fugir pro boteco da esquina, mas fica firme e entra.
Segue direto para uma esteira – não pode ser tão difícil assim –, sobe e, ao apertar “iniciar”, já bate um semipânico daquele tranco que o aparelho dá quando começa a funcionar.
Mas você sobreviveu; está caminhando, orgulhoso. Então, cinco minutos depois, percebe que está na velocidade 3,6 e a senhora de 95 anos ao seu lado na 6,0. Coloca em 7,5 para não ficar tão feio, mas não sabe se é pra andar rápido, trotar ou correr, por isso começa a fazer movimentos estranhos, um pouco semelhantes aos de um orangotango.
Primata ou não, você conseguiu chegar a 20 minutos. E é claro que esses 20 minutos demoraram 7 horas para passar, enquanto você se perguntava como aquele filho da mãe na esteira ao lado estava há 53 minutos na velocidade 11,5.
Mas é isso aí. Você conseguiu e até já se imagina falando para o mundo, com a maior naturalidade, que já fez sua “corrida” hoje. Praticamente uma São Silvestre. E lá vai você para a musculação, fingindo não estar tão perdido quanto hare krishna em baile funk, bebendo sua água numa garrafinha de plástico fosco que ganhou do banco há 13 anos, enquanto vê as pessoas com um tipo de Nescau em copos da Nasa (“ Whey que fala, né?”). Senta-se numa máquina vazia qualquer. Mal sabe se aquilo é pra perna, braço, abdômen ou se é um caixa eletrônico. Espeta aquele pino num peso que te parece honesto e sai empurrando a primeira alavanca que vê. Está pesado demais, o negócio nem se movimenta. Vê se não tem ninguém olhando e espeta o pino mais para cima. Tenta de novo. Nada. Coloca o pino no mínimo. Faz nove repetições e se sente pronto para o octógono do UFC. Procura halteres. Vai para a frente do espelho (“Céus, pareço um imbecil nessa roupa”) e começa a trabalhar bíceps. Ou tríceps. Tanto faz, você não sabe qual é qual. De repente, quase enfarta por causa de um fortão que, depois das repetições, jogou os pesos no chão e o barulho foi tipo o apocalipse. E nem dá para você se vingar porque pesos de 2kg não fazem barulho se caírem.
Enfim. Pode ser que você tente fazer uma aula. Zumba, step, jump. A probabilidade de dar certo é de cerca de 1 em 497. Então, aqui vão duas dicas:

1. Fique no fundo. BEM no fundo. Se possível, atrás de uma pilastra e com aqueles óculos de disfarce que já vêm com um bigode.
2. Quando, na coreografia, você achar que é pra ir para a direita, vá para a esquerda e quando achar que é para a esquerda, vá para a direita. Costuma funcionar. Mas, cuidado: se tiver uma “voltinha” ou uma viradinha de 360 graus na coreografia, não faça. Vá por mim, experiência própria. Quando você voltar ao ponto inicial a música já vai ter mudado ou, se bobear, aquela aula já acabou e já está rolando uma sessão de yoga. Sério, não faça isso.

Não é fácil, eu sei. Ainda mais se estiver chovendo. Ou frio. Ou muito calor. Ou uma bela noite de verão. Ou se for Dia do Índio. Ou se for época de carambola. Qualquer desculpa é desculpa.
Mas é isso aí, vamos tentando, porque depois dos 25 ninguém mais está com a vida ganha.
E chega o dia em que o medo do espelho, da balança e das fotografias é maior do que o medo da academia. E então estaremos salvos. Vai dar tudo certo.
Se cuidem, blogueiras fitness, tô na área.

Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso

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