quarta-feira, 17 de junho de 2020

Os esquadrões

Dois esquadrões da morte disputavam o campeonato de outono. O que tinha como logotipo o escorpião levava certa vantagem sobre o que inseria na lapela, em gótico, a palavra Justice. Cinquenta e cinco massacrados, por conta do primeiro, e trinta e oito, de iniciativa do segundo, eram os números computados até a primeira quinzena de abril.
O grupo Justice, sentindo-se em inferioridade, reagiu empreendendo caçada espetacular, mas o Escorpião parecia disposto a levar-lhe a palma, e toda a periferia urbana ficou juncada de corpos.
Uns tantos indivíduos marcados para morrer, em vez de se entregarem ao pânico, decidiram enfrentar o Escorpião e o Justice, formando o terceiro esquadrão, que saía pela madrugada com ânimo e munição suficientes. Ocorreram inúmeras baixas, inclusive por engano.
Achando-se em perigo, os dois esquadrões tradicionais puseram de lado os melindres e fundiram-se numa hiperorganização. O terceiro grupo, cujo símbolo era o lobisomem, acabou achando mais útil entrar em negociações e compor-se com os adversários. O que foi feito. Constituem hoje uma força invencível, disposta a acabar com todos os inocentes da cidade.
Carlos Drummond de Andrade, in Contos plausíveis

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