sábado, 4 de maio de 2019

O retorno ao caos

Marcha à ré rumo ao caos inicial, retorno à confusão primordial, ao redemoinho original! Lancemo-nos rumo ao turbilhão anterior à aparição das formas. Que nossos sentidos palpitem neste esforço, nesta demência, nestes surtos e abismos! Que desapareça tudo o que é, a fim de que, nesta confusão e neste desequilíbrio, acessemos plenamente à vertigem total, retornando dos cosmos ao caos, da natureza à indivisão original, da forma ao turbilhão. A desintegração do mundo segue um processo contrário ao da evolução: um apocalipse inverso, mas brotando das mesmas aspirações. Ninguém deseja o retorno ao caos, a menos que já tenha sido plenamente submetido às vertigens do apocalipse.
Quão grandes são meu terror e minha alegria quando penso em ser arrebatado pelo tumulto do caos inicial, por sua confusão e sua geometria paradoxal - a única geometria caótica, sem excelência de forma nem de sentido.
A vertigem, enquanto isto, aspira à forma, e o caos mantém suas virtualidades cósmicas. Eu adoraria viver neste começo de mundo, no vórtex demoníaco das turbulências primordiais. Que nada do que, em mim, é veleidade da forma se realize; que tudo vibre de um estremecimento primitivo, como um despertar do vazio.
Eu posso viver apenas num começo ou num fim de mundo.
Emil Cioran, in Nos cumes do desespero

Nenhum comentário:

Postar um comentário