Era
meia-noite e lá fora o ruído da água apagava todos os sons.
Susana
San Juan levantou-se devagar. Endireitou o corpo lentamente e se
afastou da cama. Lá estava outra vez o peso, em seus pés,
caminhando pelas beiradas de seu corpo; tratando de encontrar sua
cara:
— É
você, Bartolomé? — perguntou.
Achou
que ouviu a porta gemer, como quando alguém entrava ou saía. E
depois só a chuva, intermitente, fria, rodando sobre as folhas das
bananeiras, fervendo em sua própria fervura.
Dormiu
e não despertou até que a luz iluminou os tijolos vermelhos,
borrifados pelo orvalho entre a manhã cinza de um novo dia. Gritou:
—
Justina!
E
ela apareceu em seguida, como se já tivesse estado ali, envolvendo
seu corpo num cobertor.
— O
que você quer, Susana?
— O
gato. Veio outra vez.
—
Coitadinha de você, Susana.
Recostou-se
sobre seu peito, abraçando-a, até que ela conseguiu levantar aquela
cabeça e perguntou:
— Por
que você chora? Vou dizer a Pedro Páramo que você é boa para mim.
Não contarei nada dos sustos que seu gato me dá. Não fica assim,
Justina.
— Seu
pai morreu, Susana. Anteontem à noite morreu, e hoje vieram dizer
que não há nada a ser feito; que já foi enterrado; que não
puderam trazê-lo até aqui porque o caminho era muito longo. Você
ficou sozinha, Susana.
— Então
era ele — e sorriu. — Veio se despedir de mim — disse, e
sorriu.
Juan
Rulfo, in Pedro Páramo
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