Não
há nada tão belo como os dias que medeiam entre o inverno e a
primavera, observou Eugênio, que gostava de olhar o céu. Nós não
temos propriamente inverno, e seria exagero dizer que temos
primavera. Misturando estações, conseguimos fazer uma terceira,
temperada, amável, com dias claros, termômetro benevolente, doçura.
Eugênio
apreciava tanto esses dias intervalares que convidou parentes e
amigos distantes a virem saborear com ele a delícia do tempo.
Acudiram em bando, enchendo o pequeno apartamento. Nessa semana o
elevador estava em reparo, o aquecedor de gás enguiçou, faltou luz,
a empregada despediu-se, mas as noites eram frescas e os dias
belíssimos. Eugênio achou que a natureza compensava bem os
incômodos domiciliares. Os hóspedes, não.
Quando
as coisas melhoraram no edifício, sobreveio um tempo de chuva e
vento, que desaconselhava botar o pé na rua. Os hóspedes, não
podendo sair de casa, e sentindo-se confortáveis, iniciaram um
joguinho, de que Eugênio não participava. Negócio dele era o azul.
“Você está empatando o nosso lazer”, disseram-lhe. “Por que
não vai passear?” Eugênio foi para a rua e apanhou a devida
pneumonia, por muito amar o bom tempo.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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