Dentro
da cratera de um vulcão que se extinguiu há 500 milhões de anos,
no alto de uma montanha de Minas de onde se vê muito longe, eu
planto árvores para meus amigos mortos e para meus amigos que vão
morrer. Para o meu amigo Ladon Sheats plantei uma árvore que se
chama “liquidambar”. A pequena muda cresceu muito e hoje é uma
árvore com mais de seis metros de altura. O estranho nessa amizade é
que nós nunca nos vimos. Ouvi sua voz uma vez apenas, ao telefone.
Eu estava nos Estados Unidos e o chamei de um telefone público.
Conversamos. Eu, livre para voar e ir para onde eu quisesse. Ele,
pássaro engaiolado cumprindo pena numa penitenciária. Agosto de
1976. Chega-me dos Estados Unidos um bilhete escrito numa folha de
bloco cortada ao meio:
“Caro
Rubem Alves: Seus pensamentos no livro Tomorrow’s Child têm
tido uma profunda influência sobre a minha vida. A sua capacidade de
sintetizar... a clareza com que você se exprime são dons muito
bonitos. Por isso sou-lhe muito agradecido. Afetuosamente, Ladon
Sheats.”
O
signatário não dizia quem era. Fiquei com o bilhete na mão, sem
saber o que pensar. Alguns dias depois, recebi carta de um amigo com
as explicações.
“Esse
bilhete foi escrito de uma prisão em Alexandria. Ladon Sheats está
cumprindo uma sentença por haver participado de uma demonstração
contra as armas nucleares acontecida no Pentágono.”
Rubem
Alves, in Do universo à jabuticaba
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