“Ler
as letras de uma página é apenas um dos muitos disfarces da
leitura. O astrônomo lendo um mapa de estrelas que não existem
mais; o arquiteto japonês lendo a terra sobre a qual será erguida
uma casa, de modo a protegê-la das forças malignas ; o zoólogo
lendo os rastros de animais na floresta; o jogador lendo os gestos do
parceiro antes de jogar a carta vencedora; a dançarina lendo as
notações do coreógrafo e o público lendo os movimentos da
dançarina no palco; o tecelão lendo o desenho intrincado de um
tapete sendo tecido; o organista lendo várias linhas musicais
simultâneas orquestradas na página; os pais lendo no rosto do bebê
sinais de alegria, medo ou admiração; o adivinho chinês lendo as
marcas antigas na carapaça de uma tartaruga; o amante lendo
cegamente o corpo amado à noite, sob os lençóis; o psiquiatra
ajudando os pacientes a ler seus sonhos perturbadores; o pescador
havaiano lendo as correntes do oceano ao mergulhar a mão na água; o
agricultor lendo o tempo no céu – todos eles compartilham com os
leitores de livros a arte de decifrar e traduzir signos.”
Alberto
Manguel, in
Uma
História de Leitura
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