terça-feira, 8 de dezembro de 2015

10 perguntas com Estevão Azevedo, o potiguar que desbancou Chico Buarque no Prêmio SP de Literatura

Veja 10 perguntas com Estevão Azevedo, o potiguar que desbancou Chico Buarque no Prêmio SP de Literatura

O então desconhecido Estevão Azevedo estampou manchetes na mídia potiguar na última semana por um motivo nobre. O jovem escritor natalense de 37 anos teve seu romance Tempo de Espalhar Pedras vencedor no prestigiado Prêmio São Paulo de Literatura, que concede a melhor premiação em dinheiro entre todos do gênero no Brasil. Estevão desbancou alguns dinossauros das nossas letras, a exemplo de Chico Buarque e Cristovão Tezza. Mas não foi com um livro de estreia. O autor também foi finalista em 2009 com o livro Nunca o Nome do Menino. Mas quem é Estevão? Do que brota sua literatura? O blog entrou em contato com ele na terça-feira, elaborou rapidamente algumas perguntas básicas e as enviou por e-mail logo depois, com a promessa das respostas no fim de semana ante o “turbilhão” de entrevistas solicitadas. Promessa cumprida, o simpático natalense conta um pouquinho de si logo abaixo:

Sergio Vilar – Breve biografia.
Estevão Azevedo – Eu nasci em Natal, em 1978. Saí de lá muito cedo, com uns três ou quatro anos, e só voltei muito mais tarde, para visitar familiares ou como turista. Vivi quase toda a vida em São Paulo. Aqui estudei primeiro jornalismo, depois letras. Trabalhei com tecnologia da informação por mais de uma década e, nos últimos sete anos mais ou menos venho trabalhando como editor de livros.
Influências literárias de ontem e de hoje?
Eu não diria influências, porque tudo nos influencia, não só aquilo de que gostamos. Exemplo: por odiar um escritor canônico, alguém pode enveredar por um caminho oposto na literatura. Nesse caso, esse alguém foi influenciado por um escritor que odeia. Além disso, é muito difícil, num caldo tão efervescente de cultura, com estímulos de todo o lado, isolar e até mesmo detectar o que nos influencia. Por isso vou citar apenas uns poucos autores de tantos que gosto ou gostei: Borges, Raduan Nassar, Nabokov, John Cheever, Tchekhov, Philip Roth, Drummond.
Qual seu livro de cabeceira atual?
Em Busca do Tempo Perdido, do Proust. Agora que terminei depois de três anos um mestrado, quero ler todos os volumes na sequência.
Proust é exageradamente detalhista…
É muito. Cem páginas só no narrador tentando dormir certa noite e esperando o beijo da mãe.
Quando começou a escrever? Que tipo de escrita?
Literatura pra valer, no melhor sentido do termo, eu comecei a escrever no início da vida universitária. Contos esparsos, alguns imaturos, outros ruins, alguns que me agradam até hoje. Só depois que publiquei o primeiro livro com alguns desses contos me aventurei na tentativa (que eu supunha impossível de dar certo) de escrever um romance.
Como se dá o processo de seus romances? Mais inspiração ou expiração? Há uma rotina definida?
Não há rotina. Como escrevi os livros durante períodos de trabalho, estudo e vida cotidiana intensos, sempre precisei dos poucos intervalos restantes, algumas noites, alguns fins de semana. Até por isso sempre demoro muito a terminar um texto mais longo. Há inspiração quando, dentre as infinitas possibilidades da linguagem, eu elejo a próxima palavra, e a próxima, e a próxima. Essa inspiração só é possível, imagino, porque houve um acúmulo de leitura, de tentativas malogradas de escrita, de elucubração durante os instantes em que não estou escrevendo. Ou seja, a opção feita por intuição só é possível por conta de uma grande quantidade de material introjetada, fruto de uma dedicação. A palavra, frase ou imagem que vem aparentemente do nada ou do inconsciente na verdade foi gestada por muito tempo.
A quem você confia revisão e opiniões dos seus livros?
A alguns pouco amigos e aos profissionais da editora que vai publicá-los.
Em 2009 você já havia sido finalista do mesmo Prêmio São Paulo de Literatura com o livro Nunca o Nome do Menino. Você sentiu alguma evolução para este premiado Tempo de Espalhar Pedras?
Evolução é uma palavra complicada pois traz em si um juízo de valor: o que vem depois é sempre melhor (mais adaptado, se formos darwinistas). Eu diria que há, entre as muitas diferenças, uma importante: o estilo de Tempo de Espalhar Pedras, por necessidade da trama e do narrador em terceira pessoa, é um pouco mais equilibrado, um pouco menos ornamentado do que o de Nunca o Nome do Menino, romance narrado em primeira pessoa por uma personagem em pleno turbilhão existencial.
O livro tem como cenário uma área de mineração. Esse ofício fez parte de alguma maneira de sua vivência? Por que essa escolha? Foi preciso muita pesquisa? Como se deu a construção dos personagens?
Nunca pus os pés num garimpo de diamante, nem tenho nenhum afeto especial pela profissão ou pelo tema. A questão da escolha é que, durante uma trilha por uma antiga região de mineração, ouvi de um guia uma história que me pareceu fortíssima: a do vilarejo de garimpeiros que é destruído pelos próprios moradores, que buscam as últimas pedras preciosas da região debaixo do piso das casas, nas ruas, nas praças. Segundo ele aquilo tinha acontecido mesmo décadas antes. Me pareceu uma alegoria poderosa dos desejos humanos que levam à destruição. Para construir o romance, fiz pesquisa em outros textos literários, brasileiros que tratavam de temas que me interessavam: garimpo, nordeste, sertão, vingança, fome, lascívia, paternidade.
A editora de seu livro premiado, a Cosac Naify, fechou as portas. Por outro lado, vemos crescimento nos e-books. Qual futuro você vê no livro e na leitura no Brasil?
Os livros digitais representam uma fatia insignificante ainda do mercado. Devem crescer e se tornar mais populares, mas o livro físico nunca deixará de existir. É um objeto absurdamente eficiente, por isso durou tantos séculos no formato atual. É portátil, confortável, durável, bonito e não depende de nenhuma fonte de energia para funcionar. O Brasil tem um mercado editorial pequeno, poucas livrarias, poucos leitores. Tudo isso, é claro, fruto de uma educação paupérrima, indigente. Sem melhorias nessa área, quem gosta ou vive de livros sempre terá poucos espaços.
Sérgio Vilar, in www.substantivoplural.com.br

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