segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Apaixonar-se: uma espécie de queda

Mas eu continuava querendo acreditar naquilo em que acreditam todos os apaixonados: que a coisa em si é melhor do que qualquer alternativa, mesmo quando não correspondida, derrotada, louca. Eu queria apegar-me à imagem do amor como uma fusão de almas, uma mistura, como o triunfo do impuro, do vira-lata, juntando o melhor de nós de modo a sufocar o que tínhamos de solidão, isolamento, austeridade, dogmatismo, pureza; o amor como democracia, como a vitória do Plural, do homem-algum-é-uma-ilha, do dois-é-bom, e a derrota do Uno, do apartheid, do limpinho, do mesquinho.
Tentei ver a falta de amor como arrogância, pois quem, senão aquele que não ama, pode considerar-se completo, um ser que tudo vê e tudo sabe? Amar é perder a onipotência e a onisciência. Apaixonar-se é mergulhar na ignorância; sim, é uma espécie de queda. Fechando os olhos, saltamos de um rochedo na esperança de cair em algo macio. Nem sempre é macio; mas ainda assim, eu repetia a mim mesmo, ainda assim, sem esse salto ninguém vive de verdade. O próprio salto é um nascimento, mesmo quando termina em morte.”
Salman Rushdie, in O último suspiro do mouro

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