“Aprender a ver - habituar os olhos à
calma, à paciência, ao deixar-que-as-coisas-se-aproximem-de-nós; aprender a
adiar o juízo, a rodear e a abarcar o caso particular a partir de todos os
lados. Este é o primeiro ensino preliminar para o espírito: não reagir
imediatamente a um estímulo, mas sim controlar os instintos que põem
obstáculos, que isolam. Aprender a ver, tal como eu o entendo, é já quase
o que o modo afilosófico de falar denomina vontade forte: o essencial nisto é,
precisamente, o poder não ‘querer’, o poder diferir a
decisão. Toda a não-espiritualidade, toda a vulgaridade descansa na
incapacidade de opor resistência a um estímulo — tem que se reagir,
seguem-se todos os impulsos. Em muitos casos esse ter que é já doença,
decadência, sintoma de esgotamento, — quase tudo o que a rudeza afilosófica
designa com o nome de ‘vício’ é apenas essa incapacidade fisiológica de não reagir.
— Uma aplicação prática do ter-aprendido-a-ver: enquanto discente em
geral, chegar-se-á a ser lento, desconfiado, teimoso. Ao estranho, ao novo
de qualquer espécie deixar-se-o-á aproximar-se com uma tranquilidade hostil, —
afasta-se dele a mão. O ter abertas todas as portas, o servil abrir a boca
perante todo o fato pequeno, o estar sempre disposto a meter-se, a lançar-se de
um salto para dentro de outros homens e outras coisas, em suma, a famosa ‘objetividade’
moderna é mau gosto, é algo não-aristocrático par excellence.”
Friedrich
Nietzsche, in Crepúsculo dos Ídolos
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