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“Dos diversos instrumentos do homem, o mais
assombroso é, indubitavelmente, o livro. Os outros são extensões do seu corpo.
O microscópio e o telescópio são extensões da vista; o telefone é o prolongamento
da voz; seguem-se o arado e a espada, extensões do seu braço. Mas o livro é
outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.
Em César e
Cleópatra de Shaw, quando se fala da biblioteca de Alexandria, diz-se que
ela é a memória da humanidade. O livro é isso e também algo mais: a imaginação.
Pois o que é o nosso passado senão uma série de sonhos? Que diferença pode
haver entre recordar sonhos e recordar o passado? Tal é a função que o livro
realiza.
(...) Se lemos
um livro antigo, é como se lêssemos todo o tempo que transcorreu até nós desde
o dia em que ele foi escrito. Por isso convém manter o culto do livro. O livro
pode estar cheio de coisas erradas, podemos não estar de acordo com as opiniões
do autor, mas mesmo assim conserva alguma coisa de sagrado, algo de divino, não
para ser objeto de respeito supersticioso, mas para que o abordemos com o
desejo de encontrar felicidade, de encontrar sabedoria.”
Jorge Luís Borges, in Ensaio: O Livro
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