“Por
nosso mal lá chega a idade, em que não queremos mais fortunas, que o viver; conhecemos a ilusão delas, e
se as buscamos, é como por costume, mas sem ânsia, e sem desassossego; o desejo
de as alcançar, é como um resto de calor, que apenas se faz sentir. Não refletimos
sobre o pouco tempo, que devemos gozar um bem, senão depois de o ter: só então
consideramos o muito que custou a alcançar, e o pouco que o havemos possuir.
Em cada país há um modo com que as coisas
se imaginam; o que é fortuna em uma parte, é desgraça em outra, o que aqui se
busca com empenho, ali se despreza totalmente. Os objetos que entretêm a
vaidade, e estimação dos homens, são como ídolos, que só se veneram em lugar
determinado, e fora daquele tal espaço, a adoração se troca em vitupério; o
mesmo mármore de que em Atenas se faria uma Minerva, transportado a outro
lugar, apenas servirá de base a uma coluna; assim é a vaidade, por mais que
seja universal nos homens, os motivos dela não são universais.”
Matias
Aires, in Reflexões Sobre a Vaidade dos Homens e Carta
Sobre a Fortuna
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