“Lançar a melhor carta na baralha talvez
é treta de jogador; esconder com indústria o com que melhor se pode ganhar,
nunca foi consequência de perder. Que importa que no jogo seja o rei a melhor
carta, se talvez porque as espadas são trunfo, não faz a figura vaza? A inveja
é a espada que mais corta, e está esta carta de espadas levantada, desde que no
jogo da fortuna se levantaram sujeitos. Esconder, pois, a melhor figura, será a
melhor prudência para que ganhe a seu tempo. (...) Encobrindo a terra seus
metais e ocultando o mar suas pérolas, granjeia em nossa estimação maiores
admirações. O mesmo coral, que por baixo da água é buscado pelo seu valor,
quando já descoberto, parece que, de corrido, se torna vermelho. É melhor que
luzir em todo o tempo, o luzir somente a tempo; assim se enganam os olhos da
inveja, e assim se concilia nos ânimos a estimação. Destes temperilhos
necessita a fortuna, para se conservar sempre próspera, e de tal maneira que,
como o seu curso é em roda, e no esférico não há primeiro nem último lugar,
pode o último vir a ser o primeiro, e o primeiro vir a ser o último.”
Padre
Antônio Vieira, in As Sete Propriedades da Alma
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