sábado, 1 de dezembro de 2012

Abraçaço: a melancolia do medalhão rebelde Caetano Veloso


Caetano Veloso sobre a Banda Cê: “Adoro essa banda, tocar com ela. É miraculoso. Nunca tive com eles 10 segundos de atraso, de dizer uma ideia e esperar para que ela se resolva. Quando vai, já é”
Foto: Michel Filho

A guitarra marcada de “Odeio” é uma das marcas mais fortes — de uma das canções mais fortes — do álbum “Cê”, lançado em 2006. Seis anos depois, ela ecoa nos primeiros segundos de “A bossa nova é foda”, primeira faixa do novo CD do baiano, “Abraçaço” (Universal). A ligação explícita é uma piscadela indicando uma ponte entre os discos da trilogia que, iniciada em "Cê" e seguida por "Zii e zie" (2009), chega agora à sua conclusão — definindo o fim da fase Banda Cê, formada por Pedro Sá (guitarra), Marcelo Calado (bateria) e Ricardo Dias Gomes (baixo).
O trajeto traçado pelo artista e o trio de jovens músicos desde o primeiro até agora pode ser descrito como o que vai do rancor de “Outro” (primeira de “Cê”) ao amor puríssimo de “Gayana” (última de “Abraçaço”), do indie-rock de 2006 ao violão que guia o disco que chega semana que vem às lojas. Ou da raiva à melancolia, como descreve o compositor:
— O “Cê” é mais pau duro — diz, em referência aos versos “Feliz e mau como um pau duro/ Acendendo-se no escuro”, de “Outro”. — Tem até esse tema da amargura agora, que tinha no “Cê”. Mas o “Cê” era mais alegre. “Abraçaço” tem uma melancolia que não tinha antes. O “Cê” tinha raiva, até angústia, mas não melancolia. Tinha a canção “Minhas lágrimas”, que era triste. Mas “Estou triste” (do novo disco, de versos como “Por que será que existe o que quer que seja?/ O meu lábio não diz, o meu gesto não faz/ Eu me sinto vazio/ E ainda assim farto”) é a mais triste da trilogia. A canção “Um abraçaço” é bonita e melancólica. É muito simples, ela quase não existe, mas tem emoção. E essa emoção é cheia de melancolia, marcada pela melancolia.
A canção trata de um desencontro que se prometia encontro (“Você não se deixou ficar/ No meu emaranhado/ Foi parar do outro lado/ Do outro lado de lá de lá”). Mas se em outros tempos Caetano já transformou o tema em alegria rock (“Eclipse oculto”), agora ele escolheu o caminho da dor.
— Nem me lembrei de “Eclipse oculto”, mas tem a ver. Tem um “não deu certo” na letra de “Um abraçaço”: “Tudo que não deu certo/ E sei que não tem conserto/ Meu silêncio chorou, chorou”. Em “Eclipse oculto” era “Nosso amor não deu certo/ Gargalhadas e lágrimas” — canta animadamente, rindo.
Na canção, abraçaço (despedida que Caetano usa às vezes nos e-mails) é o que ele manda para a musa — como a única coisa que restou a ele fazer após o desencontro. No nome do disco, traz uma ideia mais ampla:
— Abraçaço é uma palavra muito bonita e tem essa reverberação, parece um eco, mais ainda quando escrito, esse a-ce-cedilha duas vezes. É como se fossem círculos concêntricos de abraços, que vão se expandindo. Não é apenas grande ou maravilhoso como é um golaço, por exemplo. É expansivo. No disco, o abraçaço abarca desde cena íntimas até o fato que "o império da lei há de chegar ao coração do Pará".
“O império da lei” é uma das canções do disco que abandona a melancolia e abraça a contundência. Composta em homenagem a figuras como Dorothy Stang, missionária assassinada em 2005 no Pará, a música é um pedido de justiça — sobre uma batida marcada da Banda Cê que faz referência aos festivo ritmos paraenses. Caetano a compôs inspirado no filme “Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios”.
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