“Pensar como espiritualistas, agir como
materialistas. Não é absurda a doutrina: é, afinal, a doutrina espontânea da
humanidade inteira.
O que é a vida da humanidade senão uma evolução
religiosa sem influência sobre a vida quotidiana?
A humanidade é atraída pelo ideal, e quanto mais
alto e anti-humano for o ideal, mais (se for progressiva) será atraída a
prática da sua vida civilizada, que, por isso, vai de povo para povo, de era
para era, de civilização para civilização. A humanidade civilizada abre os
braços a uma religião que prega a castidade, a uma religião que prega a
igualdade, a uma religião que prega a paz. Mas a humanidade normal procria,
combate-se e contrasta sempre; assim, até que acabar, sempre fará.
No mesmo tempo, na mesma sociedade, o homem normal
ateu procede em todo [o] social como o homem normal teísta; pareceria contudo
que em poucas coisas devem proceder paralelamente. Não há tese ou teoria que
afete a atmosfera que se respira.”
Fernando
Pessoa, in A educação do estoico.
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