terça-feira, 22 de outubro de 2024

Reflexões sobre Gandhi


Santos devem ser considerados culpados até que se prove sua inocência, mas claro que os critérios utilizados não são os mesmos em todos os casos. No caso de Gandhi, as perguntas que nos sentimos propensos a fazer são: em que medida Gandhi foi movido pela vaidade — pela consciência de si mesmo como um velho humilde, despojado, sentado num tapete de orações e a estremecer impérios por meio do puro poder espiritual — e em que medida comprometeu seus princípios ao entrar para a política, cuja natureza é inseparável da coerção e da impostura? Para oferecer uma resposta definitiva, temos de estudar as ações e os escritos de Gandhi com muita minúcia, pois sua vida inteira foi uma espécie de peregrinação em que cada ação foi significativa. Mas esta autobiografia parcial, que termina nos anos de 1920, é um forte indício a seu favor, ainda mais porque abrange o que ele chamaria de parte impenitente de sua vida e nos lembra que no íntimo do santo, ou do quase santo, havia uma pessoa bastante astuta e capaz, que, se tivesse desejado, poderia ter tido um sucesso extraordinário como advogado, administrador ou talvez até mesmo como homem de negócios.
Mais ou menos na época em que a autobiografia1 foi publicada pela primeira vez, lembro-me de ter lido os primeiros capítulos nas páginas mal impressas de algum jornal indiano. Causaram-me boa impressão, o que o próprio Gandhi, na época, não causou. As coisas que associávamos a ele — tecido de fio cru, “forças da alma” e vegetarianismo — não eram atraentes, e seu projeto medievalista obviamente não era viável num país superpovoado, faminto e retrógrado. Era também patente que os britânicos se serviam dele, ou pensavam fazê-lo. Estritamente falando, como nacionalista, ele era um inimigo, mas uma vez que a cada crise se empenhava para impedir a violência — o que, do ponto de vista britânico, significava impedir qualquer ação efetiva —, podiam considerá-lo “nosso homem”. Em segredo, às vezes se admitia isso com cinismo. A atitude dos milionários indianos era semelhante. Gandhi os exortou a se arrependerem, e claro que o preferiram ao socialismo e ao comunismo, os quais lhes tomariam o dinheiro se tivessem a oportunidade. É duvidoso até que ponto essas dissimulações são confiáveis no final das contas; como o próprio Gandhi diz, “no fim impostores logram apenas a si mesmos”; mas de qualquer maneira a cortesia com que quase sempre o trataram se deveu em parte à impressão de que ele era útil. Os conservadores britânicos só se irritaram realmente com ele quando, em 1942, estava na prática dirigindo a não-violência contra um conquistador diferente.
Mas mesmo na época pude perceber que os oficiais britânicos que se referiam a ele com um misto de entusiasmo e desaprovação também gostavam dele e o admiravam, até certo ponto. Nunca ninguém sugeriu que fosse corrupto ou ambicioso de alguma forma vulgar, ou que tudo o que fazia fosse movido por temor ou astúcia. Ao julgarmos um homem como Gandhi, parece que instintivamente empregamos critérios rigorosos, de maneira que algumas de suas virtudes passaram quase despercebidas. Para dar um exemplo, fica claro, mesmo na autobiografia, que sua coragem física natural era excepcional: o modo como sua morte ocorreu foi, mais tarde, uma ilustração disso, porque um homem público que se vinculasse a qualquer ideal teria sido mais prudente. Por outro lado, parece que foi totalmente isento da desconfiança maníaca que, como E. M. Forster de forma muito acertada diz em Uma passagem para a Índia, é o vício costumeiro do indiano, assim como a hipocrisia é o vício do britânico. Embora sem dúvida fosse bastante perspicaz para detectar a desonestidade, parece ter acreditado, sempre que possível, que as pessoas agiam de boa-fé e possuíam uma natureza melhor através da qual se podia abordá-las. E, embora tenha nascido numa família de classe média baixa, iniciado a vida na adversidade, com uma aparência física provavelmente nada notável, não foi atormentado pela inveja ou pelo sentimento de inferioridade. O preconceito de cor, quando deparou com ele pela primeira vez em sua pior forma, na África do Sul, pareceu tê-lo deixado pasmo. Mesmo quando combatia o que na verdade era uma guerra de cor, não pensava nas pessoas em função de raça ou condição social. O governador de uma província, um milionário do algodão, um cule dravidiano subnutrido, um soldado raso britânico, eram todos igualmente seres humanos que deviam ser tratados da mesma maneira. É notável como até nas piores circunstâncias, como na África do Sul, quando se tornava impopular como defensor da comunidade indiana, não lhe faltaram amigos europeus.
Escrita em episódios curtos para seriação em jornais, a autobiografia não é uma obra-prima literária, mas é ainda mais admirável por seu conteúdo consistir de coisas comuns. É conveniente lembrar que Gandhi começou com as ambições normais de qualquer jovem estudante indiano e só adotou as opiniões radicais pouco a pouco e, em alguns casos, com relutância. É interessante saber que, em determinado período, quando usava cartola, tomou aulas de dança, estudou francês e latim, subiu ao alto da torre Eiffel e até tentou aprender a tocar violino — tudo com a finalidade de assimilar o mais possível a civilização europeia. Não foi um desses santos marcados por uma precoce e extraordinária devoção surgida na infância, nem do tipo que renuncia ao mundo após uma impressionante vida dissoluta. Ele faz confissões detalhadas das más ações praticadas na juventude, mas na verdade não tem muito para confessar. No frontispício do livro, há uma fotografia dos bens de Gandhi na época em que morreu. Todo o conjunto de petrechos podia ser comprado por cerca de cinco libras esterlinas, e os seus pecados, ao menos os materiais, teriam todos a mesma aparência se fossem colocados numa pilha. Alguns cigarros, alguns bocados de carne, alguns anás surripiados da criada na infância, duas visitas a um bordel (em cada ocasião foi embora sem “fazer nada”), um deslize de que escapou por um triz com sua senhoria em Plymouth, uma explosão de raiva — eis mais ou menos toda a sua coleção. Praticamente desde a infância, tinha uma honestidade profunda, uma postura mais ética que religiosa, porém até por volta dos trinta nenhum senso de direção muito definido. O primeiro ingresso em algo que se pode qualificar como vida pública ocorreu por meio do vegetarianismo. Em seus aspectos menos comuns, percebemos o tempo todo os sólidos homens de negócios de classe média que foram seus antepassados. Temos a impressão de que, mesmo após ter abandonado sua ambição pessoal, ele deve ter sido um advogado enérgico e habilidoso, um astuto organizador político, cauteloso na contenção de despesas, um hábil manipulador de comitês e um incansável angariador de assinaturas. Tinha um caráter extraordinariamente variado, mas quase nada havia nele que possamos apontar e qualificar de nocivo, e penso que até os piores inimigos de Gandhi admitiriam que ele era um homem interessante e fora do comum que enriqueceu o mundo apenas por estar vivo. De que era também um homem adorável e de que seus ensinamentos podem ter o mesmo valor para os que não aceitam as crenças religiosas nas quais estão fundamentados, nunca tive muita certeza.
Nos últimos anos, tem sido moda falar de Gandhi como se ele fosse não só solidário com o movimento esquerdista ocidental como também até parte dele. Anarquistas e pacifistas, em especial, reivindicam-no para si, observando apenas que ele resistia ao centralismo e à violência do Estado, porém ignorando a tendência espiritual e anti-humanista de suas doutrinas. Mas penso que devemos compreender que os ensinamentos de Gandhi não estão de acordo com a crença de que o Homem é a medida de todas as coisas e de que nossa tarefa é tornar a vida digna de ser vivida neste mundo, que é o único mundo que temos. Fazem sentido apenas com a suposição de que Deus existe e de que o mundo de objetos sólidos é uma ilusão da qual temos de nos livrar. Vale a pena levar em consideração a disciplina que Gandhi impôs a si mesmo e que — embora ele possa não insistir com seus seguidores que observem cada detalhe — acreditava ser indispensável se quiséssemos servir a Deus ou à humanidade. Em primeiro lugar, não comer carne e, se possível, nenhum alimento animal sob qualquer forma. (O próprio Gandhi, devido à sua saúde, teve de fazer uma concessão ao leite, mas ao que parece sentiu que isso foi reincidir em erro.) Nada de bebida alcoólica ou tabaco, nenhum tempero ou condimento, mesmo do tipo vegetal, uma vez que o alimento deve ser ingerido não por si mesmo, mas somente a fim de nos preservar a força. Em segundo lugar, se possível, nada de relação sexual. Se a relação sexual tiver de ocorrer, que seja apenas com o único propósito de procriar e, presumivelmente, a longos intervalos. O próprio Gandhi, nos meados de seus trinta anos, fez o voto de bramahcharya, que significa não só castidade total mas também a eliminação do desejo sexual. Ao que parece é difícil alcançar essa condição sem uma dieta especial e um jejum regular. Um dos perigos de beber leite é que este é suscetível de despertar desejo sexual. E, por fim — este o ponto principal —, para quem busca a bondade não deve haver quaisquer amizades íntimas e amores exclusivos.
Amizades íntimas, diz Gandhi, são perigosas porque “amigos influenciam um ao outro” e por meio da lealdade a um amigo podemos ser induzidos à má ação. Isso é sem sombra de dúvida verdadeiro. Além do mais, se vamos amar a Deus, ou amar a humanidade como um todo, não podemos dar preferência a qualquer individualidade. Isso também é verdadeiro e assinala o ponto em que as atitudes humanística e religiosa deixam de ser reconciliáveis. Para um ser humano comum, o amor nada significa se não significar amar algumas pessoas mais do que outras. A autobiografia deixa vago se Gandhi se comportou de forma desatenciosa com a esposa e os filhos, mas de qualquer maneira deixa claro que em três ocasiões ele se dispôs a permitir que a esposa ou um filho morresse em vez de fornecer o alimento animal recomendado pelo médico. É verdade que a ameaça de morte nunca ocorreu de fato e também que Gandhi — sob, concluímos, grande pressão moral na direção oposta — sempre deu ao paciente a escolha de continuar vivo em troca de cometer um pecado: no entanto, se a decisão coubesse exclusivamente a ele, teria proibido o alimento animal, quaisquer que fossem os riscos. Deve haver, diz ele, algum limite para o que faremos para continuar vivos, e o limite está bem distante do caldo de carne. Essa atitude talvez seja nobre, mas, no sentido que — penso eu — a maioria das pessoas daria à palavra, é desumana. O essencial no fato de sermos humanos é que não buscamos a perfeição, é que às vezes estamos propensos a cometer pecados em nome da lealdade, é que não assumimos o asceticismo a ponto de tornar impossível uma amizade, é que no fim estamos preparados para ser derrotados e fragmentados pela vida, que é o preço inevitável de fixarmos nosso amor em outros indivíduos humanos. Sem dúvida, bebidas alcoólicas, tabaco etc. são coisas que um santo deve evitar, mas santidade também é algo que os seres humanos devem evitar. Para isso há uma réplica óbvia, porém temos de ser cautelosos em fazê-la. Nesta época dominada por iogues, supõe-se com demasiada pressa não só que o “desapego” é melhor do que a aceitação total da vida terrena como também que o homem comum só a rejeita porque ela é muito difícil: em outras palavras, que o ser humano mediano é um santo fracassado. É duvidoso que isso seja verdade. Muitas pessoas não desejam sinceramente ser santas, e é provável que as que alcancem a santidade, ou que a ela aspirem, jamais tenham sentido muita tentação de ser seres humanos. Se fosse possível buscar nas raízes psicológicas, creio que constataríamos que o principal motivo para o “desapego” é um desejo de fugir da dor de viver e sobretudo do amor, que, sexual ou não, é trabalhoso. Não é necessário argumentar aqui se o ideal espiritual ou o humanístico é “superior”. A questão é que são incompatíveis. Devemos escolher entre Deus e Homem, e todos os “radicais” e “progressistas”, do liberal mais moderado ao anarquista mais extremado, na verdade escolheram o Homem.
Contudo, o pacifismo de Gandhi pode ser separado até certo ponto de seus outros ensinamentos. O motivo era religioso, mas ele também afirmou que era uma técnica definida, um método capaz de produzir resultados políticos desejados. A atitude de Gandhi não era a da maioria dos pacifistas ocidentais. Satyagraha, desenvolvida primeiro na África do Sul, era uma espécie de campanha não violenta, uma forma de derrotar o inimigo sem feri-lo e sem sentir ou despertar ódio. Acarretava necessariamente coisas como desobediência civil, greves, deitar-se na frente de trens, submeter-se às agressões policiais sem fugir nem reagir, e assim por diante. Gandhi rejeitava a “resistência passiva” como tradução de satyagraha: no idioma guzerate, ao que parece, a palavra significa “firmeza na verdade”. Quando jovem, Gandhi serviu como maqueiro no lado britânico durante a Guerra dos Bôeres, e se dispôs a fazer o mesmo na guerra de 1914-8. Mesmo depois de ter repudiado totalmente a violência, foi bastante honesto para entender que numa guerra é em geral necessário tomar partido. Não adotou — de fato, uma vez que sua vida inteira se concentrava na luta pela independência nacional, não poderia adotar — a posição improdutiva e desonesta de pretextar que em todas as guerras ambos os lados são exatamente iguais e não faz diferença quem vence. Tampouco, como a maioria dos pacifistas ocidentais, especializou-se em evitar perguntas embaraçosas. Em relação à última guerra, uma pergunta a que todo pacifista tinha a clara obrigação de responder era: “Que dizer dos judeus? Está preparado para vê-los exterminados? Se não, como propõe salvá-los sem recorrer à guerra?”. Devo dizer que jamais ouvi de qualquer pacifista ocidental uma resposta honesta a essa pergunta, embora tenha ouvido muitas evasivas, em geral do tipo “Você é mais um”. Ocorre, porém, que em 1938 fizeram a Gandhi uma pergunta semelhante, e sua resposta está registrada em Gandhi and Stalin, de Louis Fischer. De acordo com Fischer, o parecer de Gandhi era que os judeus alemães deveriam cometer suicídio coletivo, o que “despertaria o mundo e o povo da Alemanha para a violência de Hitler”. Depois da guerra, explicou-se: de qualquer maneira, os judeus haviam sido mortos, e poderiam também ter morrido de forma significativa. Temos a impressão de que essa atitude abalou até um admirador fervoroso como Fischer, mas Gandhi estava apenas sendo sincero. Quem não está preparado para matar deve muitas vezes estar preparado para que vidas sejam perdidas de outras maneiras. Quando, em 1942, ele incitou a resistência não violenta à invasão japonesa estava preparado para admitir que isso poderia custar milhões de mortes.
Ao mesmo tempo, existem motivos para acreditar que Gandhi, que afinal nasceu em 1869, não entendeu a natureza do totalitarismo e enxergou tudo em função de sua luta contra o governo britânico. A questão importante aqui não é tanto que os britânicos o tenham tratado com tolerância, mas o quanto ele sempre foi capaz de ganhar publicidade. Como se pode perceber pela frase citada acima, ele acreditava em “despertar o mundo”, o que só é possível se o mundo tiver a oportunidade de tomar conhecimento do que você está fazendo. É difícil ver como os métodos de Gandhi poderiam ser aplicados num país em que adversários do regime desaparecem no meio da noite e jamais se tem notícias deles. Sem uma imprensa livre e o direito à reunião, é impossível não só pedir a intercessão de uma opinião externa como também criar um movimento de massa, ou mesmo que o adversário venha a conhecer as intenções de alguém. Existe um Gandhi na Rússia neste momento? E caso exista, o que ele está realizando? As massas russas só poderiam praticar a desobediência civil se a mesma idéia lhes ocorresse de modo simultâneo, e mesmo assim, a julgar pela história da fome ucraniana, não faria a menor diferença. Mas concebamos que a resistência não violenta possa ser eficaz contra um governo ou contra uma força de ocupação: mesmo assim, como colocá-la em prática internacionalmente? As várias declarações contraditórias de Gandhi sobre a última guerra parecem mostrar que ele entendia a dificuldade disso. Aplicado à política externa, o pacifismo deixa de ser pacifista ou se transforma em conciliação. Além disso, a suposição, que foi muito útil para Gandhi ao lidar com indivíduos, de que todos os seres humanos são mais ou menos afáveis e responderão bem a um gesto generoso carece de contestação séria. Não é necessariamente verdadeira, por exemplo, quando lidamos com loucos. A questão então passa a ser: quem é são de espírito? Hitler era? E não será possível que toda uma cultura seja insana de acordo com os critérios de outra? E na medida em que podemos aferir os sentimentos de toda uma nação, existirá alguma ligação evidente entre uma ação generosa e uma resposta amigável? Será a gratidão um fator na política internacional?
Essas questões e outras semelhantes pedem discussão, e com urgência, nos poucos anos que restam antes que alguém aperte o botão e os foguetes comecem a voar. Parece duvidoso que a civilização consiga suportar outra grande guerra, e é ao menos concebível que a saída resida na não-violência. A virtude de Gandhi é que ele estaria disposto a refletir com honestidade sobre o tipo de questão que levantei acima; e de fato deve ter debatido grande parte dessas questões em um ou outro dos inúmeros artigos que escreveu para os jornais. Temos a impressão de que ele não entendeu muita coisa, mas não de que existiu algo que receou comentar ou pensar a respeito. Jamais consegui sentir muita simpatia por Gandhi, porém não estou seguro de que como pensador político ele fundamentalmente se equivocou, tampouco creio que sua vida foi um fracasso. É curioso que, quando foi assassinado, muitos de seus admiradores mais fervorosos afirmaram com pesar que ele vivera o tempo suficiente para ver o trabalho de uma vida em ruínas, porque a Índia estava envolvida numa guerra civil que sempre fora prevista como uma das consequências da transferência de poder. Mas não foi tentando aplacar a rivalidade entre hindus e muçulmanos que Gandhi passou a vida. Seu principal objetivo político, o fim pacífico do domínio britânico, havia sido por fim alcançado. Como de costume, os fatos pertinentes se interconectam. De um lado, os britânicos realmente saíram da Índia sem lutar, um acontecimento que poucos observadores profetizaram mais ou menos um ano antes de ocorrer. De outro, isso foi levado a efeito por um governo trabalhista, e decerto um governo conservador, sobretudo um governo liderado por Churchill, teria agido de outro modo. Mas se em 1945 formara-se na Grã-Bretanha uma grande frente de opinião favorável à independência da Índia, até que ponto isso se devia à influência pessoal de Gandhi? E se, como pode acontecer, Índia e Grã-Bretanha por fim iniciarem uma relação amistosa e razoável, será em parte por causa de Gandhi, por ele ter sustentado sua luta obstinada e, sem ódio, ter desinfetado o ar político? Só o fato de essas perguntas nos ocorrerem já indica a estatura desse homem. Podemos sentir, como sinto, uma espécie de aversão estética a Gandhi; podemos rejeitar as reivindicações de santidade feitas em seu nome (aliás, ele próprio jamais fez tal reivindicação); podemos também rejeitar a santidade como um ideal, e portanto entender que os objetivos básicos de Gandhi eram anti-humanos e reacionários: mas considerado apenas como político, e comparado a outras figuras políticas importantes de nosso tempo, que rastro de aroma puro ele deixou!

George Orwell, em Dentro da baleia e outros ensaios

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